Etiologia e epidemiologia da tinea capitis: relato de série de casos e revisão da literatura

Etiology and epidemiology of tinea capitis: case-serie report and literature review [I]

 

Carolinne Serafim da Silva1

Paulo Murillo Neufeld2

Emanuela Heiderick Gouvêa3

Paula Alvarez Abreu3

 

1Fundação Técnico-Educacional Souza Marques – Rio de Janeiro-RJ, Brasil.
2Laboratório de Micologia Médica e Forense, Faculdade de Farmácia, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Rio de Janeiro-RJ, Brasil.
3Instituto de Biodiversidade e Sustentabilidade, Campus Macaé, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) – Macaé-RJ, Brasil.

Instituição: Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) – Rio de Janeiro-RJ, Brasil.

Recebido em 04/10/2018
Artigo aprovado em 05/10/2018
DOI: 10.21877/2448-3877.201800781

 

INTRODUÇÃO

Dermatofitoses são micoses superficiais, causadas por fungos filamentosos denominados dermatófitos, que são capazes de degradar estruturas queratinizadas como pêlos, unhas e pele. Os agentes etiológicos associados a essa infecção em humanos pertencem a três gêneros principais, a saber: Microsporum, Trichophyton e Epidermophyton.(1)  Transmitida por contágio direto ou indireto, as dermato­fitoses são de ocorrência mundial e consideradas o terceiro distúrbio de pele mais frequente em crianças menores de 12 anos e o segundo mais frequente na população adulta.(1,2)

O quadro clínico das dermatofitoses inclui lesões tipicamente cutâneas, conhecidas como tineas, sendo a sua designação atribuída de acordo com a área afetada: tinea capitis (região do couro cabeludo), tinea corporis (região do corpo/pele glabra), tinea manum (região das mãos), tinea cruris (região inguinal), tinea pedis (região dos pés) e tinea unguium (unhas das mãos e dos pés).(3)

A tinea capitis é uma dermatofitose que acomete o couro cabeludo, sobrancelhas e cílios, afetando, principalmente as crianças.(4) Esses processos são ocasionados, basicamente, por espécies de fungos antropofílicos, ou seja, que parasitam, preferencialmente, a queratina dos seres humanos. Entre essas espécies, destacam-se Trichophyton rubrum, T. mentagrophytes, T. tonsurans e Epidermophyton floccosum, entretanto, espécies como Microsporum canis, apesar de zoofílicas, também podem acometer os humanos.(5,6) Inicialmente, essa condição se manifesta como uma lesão circular, semelhante a um anel, de coloração avermelhada e escamosa, acompanhada de alopécia, que pode se tornar agudamente inflamada, formando lesões ulceradas.(7)

A transmissão pode ocorrer por relação direta com pessoas e animais infectados ou por meio de objetos e contato com locais onde os esporos dos fungos tenham sido depositados, e tanto crianças como adultos podem ser portadores assintomáticos.(8) O diagnóstico primário é baseado na microscopia ótica, sendo a cultura necessária para a identificação definitiva do agente etiológico e para a instituição do tratamento específico com antifúngicos tópicos e/ou sistêmicos.

Relativamente à sua distribuição geográfica mundial, os dermatófitos são microrganismos oriundos, fundamentalmente, de grandes centros urbanos. Uma avaliação epidemiológica envolvendo 16 países na Europa demonstrou que 35% a 40% dos indivíduos analisados apresentavam infecção dermatofítica no couro cabeludo. Outro estudo, realizado com crianças em creches, nos Estados Unidos, revelou que 22% a 50% delas apresentavam infecção por dermatófitos também nesse sítio anatô­mico.(9,10)

Na América do Sul, um estudo realizado na cidade de Valparaíso, Chile, observou que, dentre os 1.004 pacientes diag­nosticados com micoses superficiais, as dermatofitoses eram as mais prevalentes.(11) Em 2010, uma pesquisa realizada na Venezuela, com crianças de uma unidade escolar, constatou que o Microsporum canis e o  Trichophyton rubrum foram as espécies mais isoladas de tinea capitis.(12)

As dermatofitoses assumem especial importância em saúde pública dada a sua elevada prevalência e fácil disseminação por contato direto com humanos ou animais infec­tados ou indireto com objetos contaminados, além de longos períodos requeridos para o tratamento e a tendência de desenvolvimento de resistência aos fármacos de uso clínico. Neste aspecto, o conhecimento sobre a patogênese dos derma­tófitos se faz importante,(13) assim como o entendimento sobre a epide­miologia sobre suas infecções. Neste sentido, o objetivo deste trabalho foi revisar os estudos epidemiológicos sobre tinea capitis em relação aos seus agentes etiológicos e à população afetada e discutir a importância clínica do tema para o Brasil com a apresentação de uma série de casos dessa condição.

 

MATERIAL E MÉTODOS

 

A metodologia utilizada envolveu uma busca realizada nas bases de dados Scientific Electronic Library Online (SciELO) e Google Acadêmico (Scholar Google). Para obtenção das informações, foram considerados artigos publicados em Inglês e Português, no período de 2000 até 2018, utilizando-se os descritores: tinea capitis e epide­miologia.

As referências obtidas foram analisadas, excluindo-se aqueles artigos que não se vinculavam à proposta do estudo, sendo incluídos aqueles que tratassem de estudos epidemiológicos de tinea capitis ou relatos de casos no Brasil. Ao final da pesquisa, vinte artigos foram considerados relevantes para a revisão, sendo 16 estudos epide­mio­lógicos específicos de tinea capitis e cinco relatos de caso.

Na revisão dos trabalhos científicos, foram analisados a epidemiologia da micose, as principais espécies de fungos envolvidas, o local e período em que foram identificados os casos, o sexo dos pacientes e os métodos de diagnóstico empregados. Em relação aos estudos de casos, foram avaliados os agentes, as características dos pacientes, o tipo de lesão, o método de diagnóstico e o tratamento quimioterápico e, a partir desse conjunto de informações, foi realizada uma comparação entre os estudos.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

Estudos epidemiológicos de tinea capitis

 

As investigações foram realizadas em amostras de couro cabeludo de casos suspeitos de tinea capitis, nas regiões sul, sudeste, norte, nordeste e centro-oeste do Brasil, num intervalo de tempo de 1983 a 2017. (Tabela 1). O número de amostras analisadas variou de 11 a 1.332, de acordo com o tempo e local de realização dos estudos. No tocante à distribuição da tinea capitis, a prevalência dessa infecção fúngica é variável, pois sua ocorrência depende de características geográficas, como temperatura e umidade, socioeconômicas do local, bem como das particularidades de cada paciente.(14) 

Alguns estudos avaliaram um número bastante grande de pacientes como o realizado em Pernambuco, com 1.332 indivíduos, em Porto Alegre com 1.283 pacientes, em Cuiabá com 985, em Botucatu com 596 e em Fortaleza com 534. Estes estudos são bastante importantes para análise sobre a epidemiologia da doença, e, tendo sido realizado em diferentes regiões do Brasil, facilita o entendimento sobre a doença.(14-18)

Na maioria dos artigos revisados foi observado maior número de casos no sexo mascu­lino em todas as regiões. Entretanto, em um estudo no estado do Ceará, dois no Amazonas, um na Paraíba e um em Santa Catarina foram observados mais casos no sexo feminino.(18-22) O sexo masculino, tradicionalmente, é o mais acometido pelas tinhas de couro cabelo e na literatura não há relatos sobre os motivos pelos quais tal grupo de fungo tem incidência maior sobre o sexo masculino, mas hipoteticamente pode estar associado a alguma imunodeficiência ou imunossu­pressão, ou pelo maior contato com animais infectados.(23- 25)

Nos últimos anos, a prevalência de espécies envolvidas com as dermatofitoses vem mudando, sendo que, quando se consideram as espécies que mais causam infecções em todo o mundo, observa-se um destaque para T. rubrum como principal agente de dermatofitoses nas unhas e pele enquanto que M. canis, T. tonsurans e T. violaceum são predominantemente envolvidos em tinea capitis.(26,27)

 

 

1

Nesta revisão foi observado que as principais espécies associadas à tinea capitis foram T. tonsurans e M.  canis, já que foram as espécies mais identificadas nas amostras clínicas positivas para tinea capitis na maioria dos estudos (Tabela 1). Secundariamente, T. mentagrophytes e T. rubrum foram os dois dermatófitos mais encontrados na terceira ou quarta posição. Numa investigação em João Pessoa, T. verrucosum foi relatado na quarta posição, representando 10% dos casos estudados.(21) 

É importante mencionar que Trichopphyton spp. foi o agente mais isolado de amostras de couro cabeludo, em diversos estudos, contudo, dependendo das condições geográficas e do período analisado, as espécies de Trichophyton apresentavam variações de prevalência locais. Dentre essas espécies, T. tonsurans, T. rubrum e T. mentagrophytes foram os organismos responsáveis pela maior parte das infecções no país, sendo que T. tonsurans foi o principal agente em vários estudos nas regiões norte, nordeste e centro-oeste.(16,19,20,28,29) No Sul e no Sudeste do Brasil, todavia, o dermatófito mais isolado foi o M. canis.(9,15,17,31)

Soares e colaboradores (2017) demonstraram em sua revisão da literatura que T. tonsurans tem sido o principal agente identificado causando tinea capitis, seguido M. canis, sendo que a substituição do M. canis, que já foi no passado o principal agente etiológico, parece estar relacionado ao clima, mudanças de hábitos, urbanização e aspectos socio­econômicos.(30) 

Conforme pesquisa de Schechtman RC (2015), a temperatura e umidade relativa elevadas condicionam favoravelmente a distribuição geográfica do T. tonsurans.(32) A distribuição de T. tonsurans é ainda facilitada por sua grande adaptação à queratina do ser humano e capacidade de burlar as defesas inatas do hospedeiro, permanecendo como uma infecção assintomática ou residual com exacerbações clínicas eventuais.(17,33,34)

Dentro do gênero Microsporum tem sido relatado que M. canis é o principal agente de tinea capitis nas regiões sul e sudeste do Brasil. Por se tratar de uma espécie zoofílica, a infecção pode ser adquirida pelo contato com animais infectados, constituindo cães e gatos os principais reservatórios e fontes de infecção. Relativamente à dermatofitose animal, lesões cutâneas evidentes são observadas com facilidade em cães, entretanto, lesões diminutas ou quadros assintomáticos são mais encontrados em gatos, o que representa uma dificuldade no controle epidemiológico da doença.(27)

Nesta revisão de casos, pacientes com menos de 10 anos foram preponderantes. Segundo Brilhante e colaboradores (2000), os indivíduos menores de 10 anos são os mais susceptíveis às dermatofitoses quando em contato próximo com cães e gatos, ressaltando a transmissão zoonótica nessa faixa etária.(18) No caso da infecção por T. tonsurans, por se tratar de uma espécie antropofílica, a transmissão se faz, geralmente, de pessoa-a-pessoa ou por meio de com­partilhamento de objetos de uso pessoal.(8)

O estudo micológico para a identificação das espécies de dermatófitos consiste no exame microscópico direto da amostra clínica com hidróxido de potássio (KOH), o que possibilita a visualização de estruturas fúngicas nos fios de cabelos, seguido de cultivo em ágar de Sabouraud dextro­sado, para o isolamento dos dermatófitos, permitindo a determinação da espécie fúngica envolvida na infecção. Nos trabalhos aqui avaliados, houve diferenças em relação à concentração de KOH, que variou entre 20% a 40%. Essa faixa de concentração, todavia, está em concordância com aquela (10% a 40%) geralmente preconizada para a observação tecidual de dermatófitos (Tabela 1). O meio de cultivo padrão para o isolamento de derma­tófitos é o ágar de Sabouraud dextrosado, apesar de outros meios, como o Ágar Mycosel, terem sido empregados por alguns autores. Esse meio apresenta em sua formulação um antibacteriano (cloranfenicol) e um antifúngico (cicloheximida). O cloran­fenicol é utilizado para evitar o crescimento bacteriano inde­sejado. A cicloheximida, por sua vez, é importante para inibir o crescimento de fungos contaminantes, sem impedir o crescimento dos fungos patogênicos, como os derma­tófitos e os dimórficos, o que facilita o isolamento destes fungos em amostra clínica.(29, 30)

 

Estudos de casos clínicos de tinea capitis

 

Nesta pesquisa, casos clínicos de tinea capitis no Brasil foram revisados e diversos hospedeiros foram relatados, tais como recém-nascidos, crianças e adultos. As lesões exibiram diferentes características clínicas com variado quadro inflamatório, acompanhado de eritema, descamação, prurido, alopecia e/ou supuração (Tabela 2). Estudos demonstraram que o tipo e a intensidade da lesão dependem da interação entre os agentes etiológicos e os hospedeiros acometidos. As lesões com características mais inflamatórias estão relacionadas, comumente a espécies zoofílicas, como o M. canis e o T. mentagro­phytes.(8) Por apresentarem características inflamatórias mais evidentes, as espécies zoofílicas provocam lesões extremamente inflamadas, com perda de cabelo e lesão do tipo Kerion di Celsi. Já as espécies antropofílicas (T. rubrum, T. tonsurans, T. viola­ceum e M. audouinii) provocam, em geral, lesões menos agressivas e que tendem à cronici­dade.(7)

No caso relacionado a uma criança de 4 meses de idade, a tinea capitis causada por um T. tonsurans apresentava-se assintomática, o que dificultou o manejo e o controle da infecção nesse paciente. Observou-se uma micro­epidemia entre os familiares e o fungo foi isolado da residência da família, facilitando a reinfecção.(33) Em crianças e lactentes, essa infecção é clinicamente importante por se tratar de indivíduos que apresentam normalmente grande susceptibilidade a infecções fúngicas, e pela possibilidade de disseminação do agente a outras crianças em creches ou mesmo no ambiente familiar.

No relato de tinea capitis por M. audouinii(35) o caso apresentou relevância pela determinação desse fungo como o agente etiológico, pois o M. audouinii, até então, só tinha sido isolado em países europeus.(7) Recentemente, contudo, o fungo foi recuperado de lesões em duas crianças, no estado do Rio de Janeiro, e que nunca tinham deixado o país. Esse foi o primeiro relato do isolamento de M. audouinii, no Brasil.

Conforme relatado na literatura, parece que o M. audouinii sempre esteve presente em território nacional e a falta de publicação sobre seu isolamento se deveu, possivelmente, a confusões na distinção entre ele e o M. canis ou que, mesmo após a identificação do patógeno como M. audouinii, o caso não tenha sido reportado ao Ministério da Saúde ou a outros órgãos de vigilância em saúde ou ainda publicados em revista científica por pesquisadores nacionais.(35)

Relativamente ao diagnóstico, Pinheiro e colaboradores (2012)(7) apresentaram um relato de caso do uso do dermatoscópio como um método não invasivo e de baixo custo para auxiliar no diagnóstico de tinea capitis, independentemente  do agente, sendo demonstrada a presença de pêlos em “vírgula” e cabelos em “sacarrolhas” e pelo método direto e cultura foi identificado T. tonsurans.

Os antifúngicos reportados nos casos clínicos aqui apresentados foram a griseofulvina, derivados azólicos (fluconazol, oxiconazol, itraconazol, cetoconazol) e a terbinafina, e, em alguns casos, foi utilizada associação de mais de um antifúngico (Tabela 2). Griseofulvina foi utilizada na maioria dos casos clínicos aqui reportados. O mecanismo de ação da griseofulvina se dá pela ligação da tubulina, que é uma proteína que forma os microtúbulos do fuso acromático, inibindo o processo de mitose do fungo. Desde muito tempo, a griseofulvina tem sido usada para o tratamento da tinea capitis, devido à sua eficácia e boa tolerância, especialmente em crianças, o baixo custo e mínimos efeitos colaterais.(27) Contudo, uma desvantagem de sua utilização é a necessidade de um tratamento de longa duração (6-12 semanas), o que leva, muitas vezes, a uma redução na taxa de adesão terapêutica e, conse­quentemente, à recidiva das lesões.(11)

2

 

 

 

O cetoconazol, o itraconazol, o fluconazol e a terbi­nafina são antifúngicos que inibem enzimas da via de biossíntese do ergosterol, levando à redução da conversão de lanosterol em ergosterol, principal esterol presente na membrana celular dos fungos.(8) A diminuição na síntese de ergosterol faz com que haja a desestabilização da membrana, alteração da permeabilidade e inibição do crescimento fúngico.(36) Estudos mais recentes demonstraram que, apesar desses fármacos terem perfis de eficácia semelhantes aos da griseofulvina, essa parece ser mais efetiva frente a infecções por Trichophyton do que por Microsporum.(16,37)

No caso relatado por Melo-Monteiro e colaboradores, (2003), o estudo visou chamar atenção porque apesar da baixa incidência de M. gypseum no Rio de Janeiro nos últimos anos têm sido relatados dermatofitoses provo­cadas por este agente. O caso estava associado a um paciente do sexo masculino de 3 anos de idade que apresentou uma forma clínica de tinea do couro cabeludo denominada de Kerion Celsi, caracterizada pela presença de placas edematosas com aspecto bem delimitado, dolorosas, com pústulas e abscessos que drenam pus e são provocados, geralmente, pelo M. gypseum. O tratamento de escolha neste caso foi a administração por via oral de griseofulvina para melhora do paciente. Griseofulvina é geralmente o tratamento de escolha para tinea capitis por espécies de Microsporum.(38) Por outro lado, infecções por Trichophyton são prioritariamente tratadas com terbinafina ou alternativas como fluconazol e itraco­nazol.(39)

Por fim, estudos em distintas regiões do mundo mostraram a diferença na etiologia de tinea capitis. Algumas espécies são endêmicas em algumas regiões geográficas, como T. violaceum no leste europeu, África, Ásia e América do Sul e T. soudanense na África e Ásia. Microsporum canis já é o agente mais prevalente em países desenvolvidos, e pode estar associado ao contato com animais, já que o fungo é zoofílico.(40) Aqui, estudos epidemiológicos e de casos foram relatados por espécies antropofílicas, zoofílicas e geofílicas. Apesar de ser comum a infecção no ser humano por dermatófitos zoofílicos e geofílicos, é rara a infecção animal por derma­tófitos antropofílicos.(41)

Por se tratar de micoses em que o fungo está presente na natureza, podendo levar a infecção, estudos que avaliam dermatófitos isolados do solo no Brasil também são de grande importância,(42,44) já que o crescimento destes organismos pode ser influenciado por fatores ambientais, pH  e presença de resíduos de queratina humana ou animal no solo, por exemplo,(41) sendo desta forma fundamental entender os fatores bióticos e abióticos que podem influenciar na epide­miologia das derma­tofitoses.(45)

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Nesta revisão da literatura, foram avaliados estudos epidemiológicos e relatos de caso sobre tinea capitis no Brasil, sendo observado que o gênero masculino foi o mais afetado e a faixa etária com maior incidência de infecções foi aquela de indivíduos menores de 10 anos.

No que diz respeito ao padrão ecológico dos derma­tófitos, foram observadas infecções por fungos antro­pofílicos e zoofílicos. As espécies T. tonsurans, M. canis e T. rubrum foram responsáveis por grande parte das dermatofitoses no couro cabeludo, variando a prevalência conforme a região do país. A observação da incidência de tinea capitis por T. tonsurans e/ou por M. canis é de fundamental importância no que se refere à epidemiologia e ao tratamento das dermatofitoses, visto que a literatura especializada relata que há diferenças na distribuição geográficas das espécies e na susceptibilidade aos antifún­gicos.

As avaliações dos procedimentos propedêuticos devem ser realizadas criteriosamente, pois há relatos de reposta terapêutica não eficiente com complicação das lesões e prolongamento do tempo de tratamento. Deve-se também interromper a cadeia de transmissão da infecção.  Para tanto, é necessário fazer um correto diagnóstico da etiologia para possibilitar a instituição de adequadas medidas de controle, que incluem o tratamento com o antifúngico específico, exame de familiares para a pesquisa de portadores assinto­máticos, principalmente nos casos de infecção pelo T. tonsurans, e cuidados com a limpeza e higienização do ambiente, objetos compartilhados e animais domésticos.

 

Abstract

Dermatophytosis is a superficial mycosis, caused by filamentous fungi called dermatophytes, which are capable of degrading keratinized structures. The agents of these infections in humans belong to three genera: Microsporum, Trichophyton and Epidermophyton. The objective of this study is to review the epidemiological studies and reports of tinea capitis cases in Brazil, based on articles published between 2000 and 2018. Based on the data analyzed, the male gender was the most affected by Tinea capitis and the most reported age group was of individuals with less than 10 years. The main species isolated from the samples were: T. tonsurans and M. canis, being the first one most found in the north, northeast and center-west regions and the second one found in the south-eastern and southern regions of Brazil. In the case reports, lesions with different characteristics were reported, being some more inflammatory, erythematous, with pustules, others with plaques of alopecia or desquamative than others. Pain and itching were symptoms observed in some cases. Griseofulvin and azole derivatives were the main drugs used in therapy, although in association in some cases. The evaluations of the treatment employed in the cases of Tinea capitis should be thoroughly done since there are reports of cases in which the therapeutic response is not efficient, aggravating the lesions and prolonging the treatment time.

 

Keywords

Tinea capitis; epidemiology; etiology, dermatophytes

 

REFERÊNCIAS

  1. Gianelli M, Araujo MAR, Proença NG, Zaitz C. Dermatofitose: estudo epidemiológico prospectivo. An Bras Dermatol. 2010;63:9-12.
  2. Zaraa I, Hawilo A, Aounallah A, Trojjet S, El Euch D, Mokni M, Ben Osman A. Inflammatory Tinea capitis: A 12-year study and a review of the literature. Mycoses. 2013 Mar;56(2):110-6.
  3. Cortez AC, de Souza JV, Sadahiro A, de Oliveira JA. Frequency and aetiology of dermatophytosis in children age 12 and under in the state of Amazonas, Brazil. Rev Iberoam Micol. 2012 Oct-Dec;29 (4):223-6.
  4. Oliveira ACP, Guilhermetti E, Kioshima ES, Pedra MR, Svidzinski TIE. Tinea capitis em Maringa, Paraná: Um estudo de 11 anos. An Bras Dermatol. 2002;77:321-8.
  5. Weitzman EO, Pontes ZBVS, Oliveira NMC, Carvalho MFP, Guerra MFL, Santos JP. Frequência de dermatofitoses em João Pessoa-Paraíba-Brasil. An Bras Dermatol. 2010;74(2):127-32.
  6. Summerbell RJ. Dermatofitoses e outras micoses superficiais. In: Mandell GL, Gordon Douglas R, Bennett JE (eds) Enfermidades Infecciosas. Princípios e prática. p. 3137-3149, 2010.
  7. Pinheiro AM, Lobato LA, Varella TC. Dermoscopy findings in tinea capitis: case report and literature review. An Bras Dermatol. 2012 Mar-Apr;87(2):313-4.
  8. Hernández T, Machado S, Carvalho C, Selores M. Tinhas do couro cabeludo na idade pediátrica. Nascer e Crescer. 2004;3: 23-6.
  9. Gürtler TGR, Diniz LM, Nicchio L. Tinea capitis micro-epidemic by Microsporum canis in a day care center of Vitória – Espírito Santo (Brazil). An Bras Dermatol. 2005 June;80(3): 267-72.
  10. Zaitz C. Dermatofitoses. In: Zaitz C, Campbell I, Marques SA, Ruiz LRB, Framil VMS. Compêndio de micologia médica. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan, 2010, cap. 15, p. 157-167.
  11. Cruz OFL, Silva MRR, Vilela NA, Silva ER, Silva HM, Jesuíno RS. Etiologia das dermatofitoses em pacientes do Instituto de Patologia e Saúde Pública da Universidade Federal de Goiás. Rev. Patol. Trop. n. 21, p.189-197, 2011.
  12. Perelli A, Calzolaio V, González L, Guatache P, Guaina O. Presencia de dermatofitos em niños de uma unidad educativa Del município Naguanagua, edo. Carabobo, Venezuela. Durante el período de 2009. Academia Biomédica Digital. v. 10, n. 43, 2010.
  13. Peres NT, Maranhão FC, Rossi A, Martinez-Rossi NM. Dermatophytes: host-pathogen interaction and antifungal resistance. An Bras Dermatol. 2010 Sep-Oct;85(5):657-67.
  14. Silva KA, Gomes BS, Magalhães OMC, Lacerda Filho AM. Etiologia das dermatofitoses diagnosticadas em pacientes atendidos no Laboratório de Micologia Médica no Centro de Biociências da Universidade Federal de Pernambuco, entre 2014-2017. RBAC. 2018;1 (50):33-7.
  15. Aquino VR, Constante CC, Bakos L. Frequência das dermatofitoses em exames micológicos em Hospital Geral de Porto Alegre, Brasil. An. Bras. Dermatol. [Internet]. 2007 June;82(3):239-244. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php? script=sci_arttext&pid=S0365-05962007000300005&lng=en.
  16. Araújo SM, Fontes CJ, Leite Júnior DP, Hahn RC. Fungal agents in different anatomical sites in Public Health Services in Cuiabá, state of Mato Grosso, Brazil. Rev Inst Med Trop Sao Paulo. 2012;54(1):5-10.
  17. Marques SA, Camargo RMP, Fares AHG, Takashi RM, Stolf HO. Tinea capitis: epidemiologia e ecologia dos casos observados entre 1983 e 2003 na Faculdade de Medicina de Botucatu, Estado de São Paulo, Brasil. An Bras Dermatol. 2005; 80:597-602.
  18. Brilhante RS, Paixão GC, Salvino LK, Diógenes MJ, Bandeira SP, Rocha MF, et al. Epidemiology and ecology of dermatophytoses in the City of Fortaleza: Trichophyton tonsurans as important emerging pathogen of tinea capitis. Rev Soc Bras Med Trop. 2000 Sep-Oct;33(5):417-25. [Article in Portuguese]
  19. Oliveira JAA, Barros JÁ, Cortez ACA, Oliveira JSRL. Micoses superficiais na cidade de Manaus, AM, entre março e novembro de 2003. An Bras Dermatol. 2006;81(3):238-43.
  20. Cortez AC, de Souza JV, Sadahiro A, de Oliveira JA. Frequency and aetiology of dermatophytosis in children age 12 and under in the state of Amazonas, Brazil. Rev Iberoam Micol. 2012;29(4): 223-6.
  21. Aquino PMLP, Lima EO, Farias NMP. Tinea capitis em João Pessoa: visão socioeconômica. An Bras Dermatol. 2003;6(78): 713-17.
  22. Fajardo AD, Silva, RR, Costa, APM, Rossetto AL, Cruz RCB. Estudo Epidemiológico das infecções fúngicas superficiais em Itajaí, Santa Catarina. RBAC. 2017;49(4):396-400.
  23. Gürtler T, Machado S, Carvalho S, Selores M. Tinhas do Couro Cabeludo na Idade Pediátrica. Nascer e Crescer. 2008;13:23-6 .
  24. Lacaz CS, Porto E, Heins Vaccari EM, Melo NT. Guia para identificação: Fungos, Actinomicetos, Algas de interesse médico. São Paulo: Sarvier. p.278 -281, 1998.
  25. Nelson MM, Martin AGH. Superficial fungal infections: dermatophytosis, onychomycosis, tinea nigra, Piedra. Fitzpatrick’s dermatology in general medicine. The McGraw-Hill Companies, United States of American, 6ª edition, cap. 205, v. 2, p. 1989-2005, 2003.
  26. Zhan P, Liu W. The Changing Face of Dermatophytic Infections Worldwide. Mycopathologia. 2017 Feb;182(1-2):77-86.
  27. Rodrigues GS, Oliveira FM, Pereira EF, Cruz RCB. Tinea capitis em adulto por Trichophyton violaceum no Brasil: relato de um caso e revisão da literatura. An Bras Dermatol. 2008;83(6):544-8.
  28. Proença NG. Dermatophytosis in childhood: clinical and therapeutic aspects. Rev Paul Med. 1990 Nov-Dec;108(6):279-84. [Article in Portuguese].
  29. Sousa FHC, Fernandes NC. Tinea capitis por Trichophy tontonsurans em crianças: papel dos portadores assintomáticos. An Bras Dermatol 2001;76(2):179-86.
  30. Soares DM, Rocha RC, Silva NF, Costa NG, Lima EO. Tinea capitis: revisão de literatura. Braz. J. Surg. Clin. Res. 2017;20(1):159-63. Acessível em: https://www.mastereditora.com.br/download-2446
  31. Veasey JV, Miguel BAF Mayor SAS, Zaitz C, Muramatu LH, Serrano JÁ. Epidemiological profile of tinea capitis in São Paulo City. An Bras Dermatol. 2017 Mar-Apr;92(2):283-284.
  32. Schechtman RC, Silva ND, Quaresma MV, Bernardes Filho F, Buçard AM, Sodré CT. Dermatoscopic findings as a complementary tool in the differential diagnosis of the etiological agent of tinea capitis. An Bras Dermatol. 2015 May-Jun;90(3 Suppl 1):13-5.
  33. Salci TP, Salci MA, Marcon SS, Salineiro PHB, Svidzinski TIE. Trichophyton tonsurans in a family microepidemic. An Bras Dermatol. 2011 Sep-Oct;86(5):1003-6.
  34. Damázio PMRBC, Lacerda HR, Lacerda Filho AM, Magalhães OMC, Neves RP. Epidemiologia, etiologia e formas clínicas das dermatofitoses em Pernambuco, 1995-2005. Rev Soc Bras Med Trop. 2007;40(4):484-6.
  35. Brito-Santos F, Figueiredo-Carvalho MHG, Coelho RA, Sales A, Almeida-Paes R. Tinea Capitis by Microsporum audouinii: Case Reports and Review of Published Global Literature 2000-2016. Mycopathologia. 2017 Dec;182(11-12):1053-60.
  36. de Oliveira JAA, Barros JA, Cortez ACA, Oliveira JSRL. Micoses superficiais na cidade de Manaus/AM. Anais Brasileiros de Dermatologia. v. 81, p. 238-43, 2005.
  37. Lopes JO, Matte SW, Werlang J, Silva C, Eidt M. Tinha por Trichophyton violaceum no Rio Grande do Sul. Rev. AMRIGS. 1994; 38:224-5.
  38. Melo-Monteiro C, Martins CJ, Monteiro CS, Paiva MB, Fagundes RO. Kerion Celsi por Microsporum gypseum. An. Bras. Dermatol. [Internet]. 2003 June;78(3):319-321. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0365-05962003000300008&lng=en.
  39. Nenoff P, Reinel D, Krüger C, Grob H, Mugisha P, Süß A, Mayser P. Tropical and travel-related dermatomycoses: Part 1: Dermatophytoses. Hautarzt. 2015 Jun;66(6):448-58.
  40. Havlickova B, Czaika VA, Friedrich M. Epidemiological trends in skin mycoses worldwide. Mycoses. 2008 Sep;51 Suppl 4:2-15. Erratum in Mycoses. 2009 Jan;52(1):95.
  41. Pinheiro Ade Q, Moreira JL, Sidrim JJ. Dermatophytoses in the urban environment and the coexistence of man with dogs and cats. Rev Soc Bras Med Trop. 1997 Jul-Aug;30(4):287-94. [Article in Portuguese].
  42. Possatto Takahashi J, Pelegrini A, de Queiroz Moreira Pereira C, Souza MC. Levantamento de fungos queratinofílicos em solo de parques e praças públicas no município de São Bernardo do Campo. Revista de Biologia e Ciências da Terra [Internet]. 2011;11(1):47-53. Recuperado de: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id= 50021097005
  43. Pontes ZB, Oliveira AC, Guerra FQ, Pontes LR, Santos JP. Distribution of dermatophytes from soils of urban and rural areas of cities of Paraiba State, Brazil. Rev Inst Med Trop Sao Paulo. 2013 Nov-Dec;55(6):377-83. doi: 10.1590/S0036-46652013000600002.
  44. da Silva Pontes ZB, Oliveira AC. Dermatophytes from urban soils in João Pessoa, Paraíba, Brazil. Rev Argent Microbiol. v. 40, n. 3, p. 161-3, 2008.
  45. Segal E, Frenkel M. Dermatophyte infections in environmental contexts. Res Microbiol. 2015 Sep;166(7):564-9.

 

Correspondência

Paula Alvarez Abreu

Instituto de Biodiversidade e Sustentabilidade,

Universidade Federal do Rio de Janeiro, Campus Macaé

 Macaé-RJ, Brasil

[email protected]