Qual é o real impacto de resultados falsos negativos no diagnóstico da COVID-19?

What is the actual impact of false-negative results on COVID-19 diagnosis?

 

Carlos Hernani Cruz Marmol1

1Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), São Carlos – São Paulo – Brasil.

Recebido em 10/03/2021
Aprovado em 29/04/2021
DOI: 10.21877/2448-3877.202100970

 

Prezado Editor,

 

Quantas pessoas ao redor do mundo receberam resultados negativos para Covid-19 quando na verdade deveriam ser positivos? A resposta para esta questão pode ser imprecisa e os motivos que levaram aos resultados falsos negativos, podem ser vários1. Porém, uma das hipóteses para este desfecho pode ter sido simplesmente um equívoco anatômico durante a coleta de secreção da nasofaringe1. Para realizar o RT-PCR, exame considerado padrão ouro para o diagnóstico da COVID-192, é preciso obter uma pequena amostra de secreção da nasofaringe, porém é possível que o swab – objeto específico para coletar amostras biológicas – possa não atingir o alvo correto, e isso pode levar ao resultado falso negativo1. Detectar rapidamente os casos positivos possibilita isolar o indivíduo e reduzir a transmissão da doença, e quando isso não ocorre a disseminação permanece. Sendo assim, quantas pessoas não foram isoladas em decorrência de resultados falsos negativos? E qual foi a contribuição deste lapso nos números alarmantes de mortes causadas pela COVID-19?

Enquanto a pandemia mostrava seu “lado sombrio”, resultados falsos negativos podem ter ocorrido por uma combinação de dois fatores, alta demanda para coleta de amostras em casos suspeitos da doença e escassez de profissionais treinados para esta atividade1; 3. Dessa forma, muitos deles foram recrutados sem experiência3, pois o cenário obrigava ações emergenciais e, provavelmente, isso pode ter desencadeado uma sequência de erros durante a obtenção de amostras da nasofaringe.

A fase pré-analítica é responsável por todos os passos que antecedem a análise laboratorial do espécime, incluindo sua coleta; qualquer erro nesta etapa pode comprometer a veracidade dos resultados laboratoriais, podendo até mesmo gerar resultados falsos negativos. Em 1983 – há quase 40 anos – o   pesquisador Edward P. Fody já havia demonstrado a grande importância da etapa de obtenção de amostras biológicas, descrevendo, inclusive, a atenção necessária para se obter amostras da nasofaringe4. Se digitarmos “fase pré-analítica” em qualquer site de busca, veremos o quão conhecido o tema é. Portanto, neste momento, faço outra pergunta: para onde estamos olhando?

Durante esta pandemia, a medicina 4.0 mostrou sua força em prol da saúde coletiva5, e o leque de alternativas tecnológicas provavelmente ainda irá se expandir. No entanto, orientações básicas para procedimentos diagnósticos permanecem sendo negligenciados. Devemos conter o entusiasmo nesta era de tecnologias emergentes e reconhecer que ainda dependemos de aspectos subjetivos na medicina laboratorial. Sobretudo na fase pré-analítica, equilibrar velhos e novos conhecimentos parece ser um caminho prudente para preservar nossas vidas.

 

Referências

  1. Higgins TS, Wu AW, Ting JY. SARS-CoV-2 Nasopharyngeal Swab Testing—False-Negative Results From a Pervasive Anatomical Misconception. JAMA Otolaryngology–Head & Neck Surgery, v. 146, n. 11, p. 993-994, 2020. ISSN 2168-6181.
  2. WORLD HEALTH ORGANIZATION. Recommendations for national SARS-CoV-2 testing strategies and diagnostic capacities. 2021. Disponível em: < https://www.who.int/publications/i/item/WHO-2019-nCoV-lab-testing-2021.1-eng >.
  3. Mehta S et al. COVID-19: a heavy toll on health-care workers. The Lancet Respiratory Medicine, v. 9, n. 3, p. 226-228, 2021. ISSN 2213-2600.
  4. Fody EP. Preanalytic Variables: A Management Problem. Clinics in laboratory medicine, v. 3, n. 3, p. 525-540, 1983. ISSN 0272-2712.
  5. Ioppolo G, et al. Medicine 4.0: New Technologies as Tools for a Society 5.0. Journal of Clinical Medicine, v. 9, n. 7,  2020.

 

 

Correspondência

Carlos Hernani Cruz Marmol

Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)

São Carlos – São Paulo – Brasil

e-mail: [email protected]

https://orcid.org/0000-0002-6930-1077