Associação da qualidade das amostras aos fatores obscurecedores dos exames citopatológicos encaminhados a um laboratório escola de Goiânia, Goiás

Sample quality association with the obscuring factors of the cytopathological exams sent to a school laboratory in Goiania, Goiás

 

Diego Deodato Rodrigues1, Nathália Fernandes Santos1, Graziela Picciola Bordoni1, Leonardo Luiz Borges2, Andrea Alves Ribeiro3

 

1  Acadêmico(a) no curso de Ciências Biológicas Modalidade Médica (Biomedicina) na Pontifícia Universidade Católica Goiás – PUC Goiás. Goiânia, GO, Brasil.

2  Doutorado em Ciências Farmacêuticas pela Universidade de Brasília, Brasil; Professor Doutor da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Escola de Ciências Médicas, Farmacêuticas e Biomédicas – PUC Goiás. Goiânia, GO, Brasil.

3  Dra. UFG (Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública), Professora Doutora da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Escola de Ciências Médicas, Farmacêuticas e Biomédicas – PUC Goiás. Goiânia, GO, Brasil.

 

Recebido em 06/10/2020

Aprovado em 10/03/2022

DOI: 10.21877/2448-3877.202202069

 

 

INTRODUÇÃO

 

O câncer de colo do útero é o terceiro tumor maligno mais frequente na população feminina, exceto o câncer de pele não melanoma, atrás do câncer de mama e do colorretal. É considerado a quarta causa de morte de mulheres por câncer no Brasil, e a estimativa de novos casos é de 16.710 para ano de 2022.(1)

O exame citopatológico tem por finalidade diagnosticar as lesões pré-cancerosas. Desta forma, a detecção precoce e o tratamento adequado, de acordo com as condutas preconizadas pelo Ministério da Saúde, previnem o câncer de colo do útero. Em países desenvolvidos foi possível reduzir a incidência do câncer de colo do útero em 80% em decorrência do rastreamento citológico implantado com qualidade, cobertura, tratamento e seguimento das mulheres.(1)

O exame citopatológico é de fácil acesso, indolor, simples, rápido e tem relação custo-efetividade favorável.(1) Segundo o Ministério da Saúde,(2) é recomendado às mulheres na faixa etária de 25 a 64 anos e que já tiveram atividade sexual. A periodicidade recomendada para o rastreamento é a repetição do exame citopatológico a cada três anos, após dois exames com qualidade adequada normais consecutivos realizados com um intervalo de um ano.(2)

A zona de transformação (ZT), também chamada de junção escamocolunar (JEC), está localizada na ectocérvix, região do colo do útero possui que epitélio colunar que foi ou está sendo substituído pelo novo epitélio escamoso metaplásico. A ZT contém as células glandulares e/ou metaplásicas e é o local onde a maioria das anormalidades e maior parte das lesões que progridem para o câncer do útero podem ocorrer, pois na ZT acontece alta taxa de multiplicação celular. Um indicador importante da qualidade do esfregaço é a presença de células escamosas, glandulares e/ou metaplásicas em quantidades representativas que tenham boa distribuição, estejam bem fixadas e coradas, permitindo uma melhor conclusão diagnóstica. Exames citopatológicos sem a representação da zona de transformação têm maior probabilidade de levar a achados falsos negativos, mascarando as anormalidades citopatológicas.(3-5)

Quando uma amostra é considerada insatisfatória significa que a leitura esteja prejudicada por razões de natureza técnica e/ou de amostragem celular. É na fase pré-analítica em que ocorrem a maior parte dos erros que podem levar às amostras insatisfatórias, podendo-se destacar problemas na coleta, ausência de identificação de lâminas e lâminas quebradas ou mesmo ausentes.(6)

As amostras são classificadas como insatisfatórias quando apresentam material acelular ou hipocelular (<10% do esfregaço) ou leitura prejudicada (>75% do esfregaço) por presença de sangue, piócitos, artefatos de dessecamento, contaminantes externos, ou intensa superposição celular. Uma amostra que possui de 50% a 75% das células obscurecidas é caracterizada como uma amostra parcialmente obscurecida.(5,7-9)

Dentre os fatores que mais comprometem a adequabilidade da amostra e que podem aumentar as taxas de resultados falsos negativos, reduzindo a precisão do exame citopatológico, destacam-se a presença de sangue, processos inflamatórios, áreas espessas, má fixação que gera dessecamento, contaminantes, artefatos de estiramento e lubrificante.(7)

A validade do exame citopatológico ainda é questionada em programas de rastreamento do câncer de colo do útero, visto que este possui uma taxa de resultados falsos negativos elevada, variando de 2% a 13%, incluindo erros de coleta, escrutínio e interpretação. A implementação de medidas na rotina dos laboratórios, como monitoramento interno de qualidade (MIQ) e externo (MEQ), pode garantir a melhoria da qualidade do exame citopatológico. Um programa de qualidade em citopatologia busca o aperfeiçoamento desse exame em detectar anormalidades escamosas e glandulares, por meio do acompanhamento e avaliação dos procedimentos dos exames citopatológicos de colo do útero, fazendo o registro escrito de rotinas e procedimentos, revisando todos os esfregaços positivos, todos os insatisfatórios e a revisão rápida de 100% dos esfregaços negativos. Esses são alguns exemplos de monitoramento da qualidade para se evitar resultados falsos negativos.(10,11)

Diante do exposto, o objetivo deste estudo foi verificar a associação da qualidade das amostras e dos fatores obscurecedores dos exames citopatológicos encaminhados a um laboratório escola de Goiânia, Goiás.

 

MÉTODOS

 

Para o desenvolvimento desta pesquisa, fez-se um estudo de corte transversal, em que foram coletados dados de 6.298 fichas de requisição dos exames citopatológicos(12) realizados no Laboratório Clínico da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (LAC-PUC Goiás), situado na cidade de Goiânia – Goiás, no período de janeiro de 2018 a dezembro de 2018, de mulheres provenientes do Sistema Único de Saúde (SUS). Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da PUC Goiás segundo o protocolo 235.376.

Os resultados citopatológicos foram classificados de acordo com a Nomenclatura Brasileira para Laudos Citopatológicos Cervicais,(12) baseada nos critérios citomorfológicos do Sistema de Bethesda: células escamosas atípicas de significado indeterminado (Atypical Squamous Cells of Undetermined Significance – ASC-US); lesão intraepitelial escamosa de baixo grau (Low Grade Squamous Intraepithelial Lesion – LSIL); células escamosas atípicas em que não se pode descartar lesão de alto grau (Atypical Squamous Cells of Undetermined Significance Cannot Exclude High Grade Squamous Intraepithelial Lesion – ASC-H); lesão intraepitelial escamosa de alto grau (High Grade Squamous Intraepithelial Lesion – HSIL); células glandulares atípicas favorecendo neoplasia (Atypical Glandular Cells Favor Neoplasic – AGC-NEO) e adenocarcinoma in situ.(7)

Nas análises estatísticas foi criado um banco de dados no software Microsoft® Excel 2013, onde foi realizado o cálculo das prevalências estratificadas por faixa etária: menores de 15 anos, de 15 a 24 anos, de 25 a 34 anos, de 35 a 64 anos e maiores de 65 anos.(13) As variáveis foram categorizadas usando as informações contidas nos laudos citopatológicos sobre os fatores que comprometem a qualidade da amostra, como: dessecamento, dessecamento e espesso, sangue, sangue e outros, espesso, espesso e piócitos e material hipocelular. Para as análises estatísticas foi utilizado o teste do qui-quadrado, utilizando o software BioEstat (R) versão 3.6.3 para o cálculo dos fatores obscurecedores e adequabilidade da amostra, com nível de significância do p<0,05. Em relação à análise da associação entre ZT e anormalidades citológicas foi utilizado o software EpiInfo™ 7.2 e realizado o cálculo do Odds ratio (OR), com nível de significância de 95% e p<0,05.

 

RESULTADOS

 

De acordo com as fichas de requisição analisadas, do total de 6.298 laudos citopatológicos, foi observado 98,08% (6.177/6.298) das amostras como satisfatórias para análise e 1,92% (121/6.298) foram classificadas como insatisfatórias (Tabela 1).

Na Tabela 2 está apresentada a prevalência de amostras com anormalidades citológicas, em que foram encontradas em 3,76% (232/6.177) dos diagnósticos citopatológicos. Observou-se 96,24% (5.945/6.177) de resultados citopatológicos negativos para lesão intraepitelial ou malignidade. A maior prevalência de resultados negativos foi de 61,37% (3.791/6.177) na faixa etária de 35 a 64 anos. Em relação às anormalidades, observou-se a maior prevalência de células escamosas atípicas, não podendo afastar lesão de alto grau (ASC-H), 1,15% (71/6.177). A lesão intraepitelial escamosa de alto grau (HSIL) mostrou-se prevalente em 0,94% (58/6.177) dos casos. Estas lesões foram mais prevalentes na faixa etária de 35 a 64 anos, sendo responsáveis por 0,66% e 0,52% dos diagnósticos nessa faixa etária.

As células escamosas atípicas de significado indeterminado (ASC-US) compreenderam 0,91% (56/6.177) dos diagnósticos, sendo também prevalente na faixa etária de 35 a 64 anos. As lesões intraepiteliais escamosas de baixo grau (LSIL) foram diagnosticadas em 0,66% (41/6.177), sendo que na faixa etária de 15 a 24 anos observou-se uma maior prevalência com 0,26% (16/41). A atipia glandular de significado indeterminado, AGC-NEO apresentou-se em 0,05% (3/6.177) das amostras analisadas e o carcinoma invasor foi observado em 0,05% (3/6.177) dos casos, sendo que a maior prevalência foi na faixa etária de 35 a 64 anos nos diagnósticos de AGC-NEO e carcinoma invasor em maiores que 65 anos.

As amostras analisadas que tiveram a zona de transformação (ZT) representada apresentaram uma associação significativa entre as anormalidades citológicas (OR: 3,86 IC: 3,87 2,62 – 5,70 p=0,000) (Tabela 3).

Em relação aos fatores obscurecedores, os laudos citopatológicos analisados demonstraram uma maior frequência de dessecamento nas amostras consideradas insatisfatórias, sendo responsável por 95,9% (116/121) de rejeição quando comparadas com as amostras parcialmente obscurecidas por dessecamento (p<0,000). O dessecamento também foi o achado mais relevante nas amostras parcialmente obscurecidas, responsável por 44,03% (70/159) dos casos. A presença de sangue nos exames citopatológicos analisados foi responsável por 20,75% (33/159) de amostras parcialmente obscurecidas e 1,65% (2/121) de amostras consideradas insatisfatórias para análise citopatológica, com uma associação estatisticamente significante para as amostras parcialmente obscurecidas por sangue (p<0,000). Quando analisado com outros fatores obscurecedores concomitantes, sangue e outros fatores obscurecedores, obteve-se 13,84% (22/159) de amostras parcialmente obscurecidas (p<0,000).

Houve uma associação estatisticamente significante entre amostras classificadas em espessas com presença de piócitos, e apresentaram-se em 10,7% (17/159) (p<0,000) das amostras parcialmente obscurecidas. Amostras dessecadas e espessas foram observadas em 6,29% (10/159) (p=0,005) das amostras parcialmente obscurecidas, já as amostras espessas foram responsáveis por 4,4% (7/159) (p=0,019). Nas amostras com material hipocelular e presença de piócitos não houve associação significativa entre as amostras consideradas insatisfatórias (p=0,104), (p=0,251), respectivamente (Tabela 4).

 

 

Tabela 1

Prevalência dos resultados satisfatórios e insatisfatórios dos exames encaminhados ao laboratório clínico da PUC Goiás em 2018.

Diagnóstico citopatológico
  n %
Satisfatórios 6.177 98,08
Insatisfatórios 121 1,92
TOTAL 6.298 100

Tabela 2

Prevalência dos diagnósticos citopatológicos estratificados por faixa etária encaminhados ao laboratório clínico da PUC Goiás em 2018.

FAIXA ETÁRIA NEGATIVOS ASC-US LSIL ASC-H HSIL AGC-NEO CARCINOMA INVASOR TOTAL
  N % n % n % n % n % n % n % n %
< 15 anos 15 0,24 1 0,02 1 0,02 0 0 0 0 0 0 0 0 17 0,28
15 a 24 anos 688 11,14 7 0,11 16 0,26 7 0,11 7 0,11 0 0 0 0 725 11,74
25 a 34 anos 1.096 17,74 17 0,28 11 0,18 20 0,32 16 0,26 0 0 0 0 1.160 18,78
35 a 64 anos 3.791 61,37 28 0,45 13 0,21 41 0,66 32 0,52 3 0,05 1 0,02 3.909 63,28
> 65 anos 355 5,75 3 0,05 0 0 3 0,05 3 0,05 0 0 2 0,03 366 5,93
TOTAL 5.945 96,24 56 0,91 41 0,66 71 1,15 58 0,94 3 0,05 3 0,05 6.177 100

Tabela 3

Associação entre componentes da zona de transformação (ZT) e das anormalidades citológicas nos exames citopatológicos analisados no laboratório clínico da PUC Goiás em 2018.

Zona de Transformação Presença de Anormalidades Ausência de Anormalidades Total OR (IC) 95% P
  n % n % n %  
Presença 199 3,22 3.625 58,69 3.824 61,91 3,86 (2,62 – 5,70) 0,000
Ausência 33 0,53 2.320 37,56 2.353 38,09
TOTAL 232   5.945   6.177 100    

Tabela 4

Fatores que comprometeram a qualidade da amostra nos exames encaminhados ao laboratório clínico da PUC Goiás em 2018 (n = 280)

Fatores obscurecedores Presente Ausente p Qui-quadrado
n f% n f%
Dessecamento          
Parcialmente obscurecida 70 44,03 89 55,97 < 0,000
Insatisfatória 116 95,90 5 4,10
Dessecamento e espesso          
Parcialmente obscurecida 10 6,29 149 93,71 0,005
Insatisfatória 0 0,00 121 100,00
Sangue          
Parcialmente obscurecida 33 20,75 126 79,25 < 0,000
Insatisfatória 2 1,65 119 98,35
Sangue e outros          
Parcialmente obscurecida 22 13,84 137 86,16 < 0,000
Insatisfatória 0 0,00 121 100,00
Espesso          
Parcialmente obscurecida 7 4,40 152 95,60 0,019
Insatisfatória 0 0,00 121 100,00
Espesso e piócitos          
Parcialmente obscurecida 17 10,70 142 89,30 < 0,000
Insatisfatória 0 0,00 121 100,00
Material hipocelular          
Parcialmente obscurecida 0 0,00 159 100,00 0,104
Insatisfatória 2 1,65 119 98,35
Piócitos          
Parcialmente obscurecida 0 0,00 159 100,00 0,251
Insatisfatória 1 0,83 120 99,17

 

DISCUSSÃO

 

Nesse estudo houve uma associação estatisticamente significante entre a adequabilidade das amostras nos exames citopatológicos e seus fatores obscurecedores.

Dentre os fatores obscurecedores que podem comprometer a análise do exame citopatológico, dessecamento foi estatisticamente significante entre as amostras consideradas insatisfatórias (p<0,000). Esse fator ocorre por má fixação, uma vez que dificulta a entrada dos corantes nas células, prejudicando a conservação das amostras. A fixação possui a função de preservar a integridade das características citomorfológicas e tintoriais das células. Também pode ocorrer quando o tempo entre a coleta e a realização do esfregaço é grande, e assim a lâmina pode perder a umidade pelo ar ou alguma fonte de calor, prejudicando a visualização da mesma por dessecamento.(14-16)

A presença de sangue neste estudo apresentou associação estatisticamente significante (p<0,000), semelhante ao estudo de Amaral et al.,(17) que demonstrou elevada frequência de esfregaços com dessecamento, purulentos e com sangue. Amaral et al.(17) identificaram uma maior frequência de resultados citopatológicos alterados quando a amostra foi classificada como satisfatória para análise e com representação de células endocervicais (p=0,001).

Zhao et al.(18) encontraram associação estatisticamente significante quando considerados todos os fatores obscurecedores, demonstrando maior malignidade em lesões de células escamosas, do que aquelas em células glandulares (p=0,001), sendo 8 em cada 10 lâminas insatisfatórias, com presença de células escamosas.

O profissional, ao realizar a coleta no colo do útero, deve estar atento e observar a quantidade significante de muco, secreção ou sangue, e fazer a retirada do excesso para evitar uma sobreposição celular, impossibilitando o escrutínio da lâmina e a identificação da lesão citopatológica.(17,19-21)

No presente estudo foi demonstrado que amostras que continham a zona de transformação e apresentaram anormalidades representavam 3,22% dos resultados citopatológicos; já quando não houve a zona de transformação, a presença de anormalidades citológicas identificadas foi de 0,53%. As amostras analisadas apresentaram uma associação estatisticamente significante das anormalidades citológicas à presença de ZT (OR: 3,86 IC: 3,87% 2,62 – 5,70 p= 0,000), resultado semelhante ao encontrado nos estudos de Mendonça et al., e Stolnicu et al.(3,22) É importante destacar que em 90% dos casos, o câncer de colo do útero ocorre em células da zona de transformação.(23,24)

Para que a amostra seja considerada adequada, é necessário que o material coletado contenha células da junção escamocolunar, visto que nessa região ocorre maior incidência de câncer cervical devido à alta taxa de multiplicação celular. A não representatividade da zona de transformação não descarta a ausência de lesões e pode levar a resultado falso negativo. A ausência da zona de transformação pode estar mascarando a presença de anormalidades citopatológicas.(23,24)

Do total de 6.177 laudos citopatológicos satisfatórios, observou-se 96,24% de resultados negativos e 1,92% foram insatisfatórios. Filipe et al.(20) mostraram, através da análise dos exames citopatológicos, que houve baixa frequência de casos insatisfatórios (<5%) em diferentes níveis de índice de desenvolvimento humano (IDH).

Dos casos satisfatórios, a maior prevalência de resultados negativos foi na faixa etária dos 35 a 64 anos, achado semelhante aos estudos de Mendonça et al.,(3) que apresentaram negatividade em 62,7% dos diagnósticos nessa faixa etária. Neste estudo, as anormalidades citopatológicas foram encontradas em 3,76% dos diagnósticos citopatológicos. Os diagnósticos menos graves foram ASC-US (0,91%) e LSIL (0,66%), com maior prevalência na faixa etária de 35 a 64 anos e de 15 a 24 anos, respectivamente. A prevalência de lesões mais graves ocorreu nos diagnósticos citopatológicos de ASC-H com 1,15%, HSIL representou 0,94% das lesões, AGC-NEO foi encontrado em 0,05% dos casos, sendo que em todos estes a faixa etária mais prevalente foi de 35 a 64 anos. O carcinoma invasor representou um total de 0,05% dos laudos citológicos, acometendo mulheres com mais de 65 anos de idade.

Estes resultados são similares aos estudos de Stolnicu et al.(22) e Lima et al.(25) que observaram as anormalidades citopatológicas com maior frequência em mulheres de 30-39 anos em 38,7% e 1,86% das amostras analisadas, respectivamente. No estudo de Ribeiro et al.,(13) a maior incidência de lesões ocorreu na faixa etária de 25 a 34 anos com 0,98% dos laudos, seguida pela faixa de 45 a 54 anos de idade com 0,84%, e 35 a 44 anos com 0,74%.

A incidência do câncer de colo do útero aumenta nas mulheres entre 30 e 39 anos de idade e atinge seu pico na quinta ou sexta décadas de vida.(1) Passos et al.(4) observaram uma prevalência de 57,20% de lesões graves em mulheres de 45 a 64 anos, sendo a idade média de diagnóstico de lesões pré-cancerosas dependente da idade da primeira relação sexual e a intensidade de testes de rastreamento.(26)

A falta de orientação, de acesso ao longo da vida e o exame tardio atrasam o diagnóstico e podem variar de acordo com as características socioeconômicas e a disponibilidade de acesso a serviços de saúde. Os problemas no rastreamento associados aos erros da fase pré-analítica, a falta de treinamento apropriado, coletas mal realizadas e fatores obscurecedores contribuem para liberação de laudos falsos negativos. De fato, grandes centros urbanos têm melhores condições econômicas, maior capacidade de investimento e maior qualificação de equipes de saúde, diminuindo esses riscos.(27)

A associação de educação continuada às mulheres e aos profissionais envolvidos gera qualificação da técnica quando todas as etapas do procedimento são seguidas e realizadas adequadamente. Isso inclui adequada orientação às pacientes, condições e técnicas de coleta do material até a interpretação das lâminas.(25,29)

Para que se evite os resultados falsos negativos, o sistema de monitoramento da qualidade deve incluir combinações apropriadas de atividades como, por exemplo, o limite de lâminas por profissional deve ser de, no máximo, 70 em uma jornada diária de 8 horas e devem ser considerados a habilidade do profissional e o grau de dificuldade que os casos podem apresentar.(10,30)

Estruturas de trabalho adequadas e processos para melhorar o desempenho dos serviços são bastante relevantes em todo o procedimento das fases, desde a coleta das amostras até a emissão dos laudos, e podem melhorar significativamente os diagnósticos citopatológicos, diminuindo os resultados falsos negativos e aperfeiçoando a conclusão diagnóstica.(10,11,27)

 

CONCLUSÃO

 

Através deste estudo foi possível observar que dessecamento e demais fatores obscurecedores foram significantes no que se refere à adequabilidade das amostras citológicas, o que reforça a importância de treinamentos e atualizações dos profissionais envolvidos, através de cursos de qualificação, como educação continuada, no intuito de reduzir os erros pré-analíticos e analíticos, buscando garantir a qualidade da amostra. Contudo, é importante evitar os fatores obscurecedores, para melhor confiança e adesão das mulheres aos exames citopatológicos, assim como a conscientização das mulheres sobre a importância do exame citopatológico, através de informações claras e ações que incentivam a busca pela saúde.

 

REFERÊNCIAS

 

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Correspondência

Andrea Alves Ribeiro

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