Atualização em coccidioses intestinais: uma abordagem crítica

Intestinal coccidia: a critical review

 

Raphael Pereira dos Santos1

Angélica Rosa Faria2

1Bacharel. Faculdade de Farmácia, Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)– Belo Horizonte-MG, Brasil.
2Doutora. Doutora. Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas, Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL), Alfenas-MG, Brasil.

Instituição: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) – Belo Horizonte-MG, Brasil.

Recebido em 14/06/2019
Artigo aprovado em 08/08/2019
DOI: 10.21877/2448-3877.201900865

 

INTRODUÇÃO

Os coccídios intestinais são importantes patógenos por serem considerados protozoários emergentes e oportunistas, tendo sido descritos em sua maioria na década de 80. Apesar de sua distribuição cosmopolita, sendo importantes causas de morbidade e mortalidade em todo o mundo, as coccidioses intestinais ganham maior notoriedade em países em desenvolvimento, onde comumente são consideradas um grave problema de saúde pública. A importância que elas assumem nesses países está relacionada à deficiência de saneamento, falta de acesso à água potável e sistemas de saúde ineficientes.(1)

As crianças comumente são bastante atingidas por enteroparasitoses em geral, seja por ainda apresentarem um sistema imunológico em desenvolvimento ou pela maior facilidade de entrar em contato com as vias de transmissão. Além disso, outro importante grupo de risco engloba os indivíduos imunocomprometidos, tais como os pacientes com HIV/AIDS, transplantados, leucêmicos ou em tratamento quimioterápico. Nesses indivíduos, os sintomas das coccidioses intestinais são mais severos e a mortalidade torna-se mais elevada.(2)

Mesmo com o aumento da frequência dessas doenças, o número de estudos acerca do problema é pequeno e, em algumas regiões do Brasil, inexistente. Conse­quen­temente, as análises comparativo-epidemiológicas são prejudicadas, interferindo significativamente na adoção de políticas públicas.(1) Desse modo, o objetivo deste trabalho foi realizar uma atualização bibliográfica a fim de se ter um panorama sobre as coccidioses intestinais, com destaque para sua ocorrência no Brasil, os métodos empregados e a análise crítica do caráter oportunista e zoonótico das infecções.

 

 

DESENVOLVIMENTO

 

Os coccídios intestinais compreendem um grupo de protozoários pertencentes ao filo Apicomplexa, possuindo estruturas apicais que auxiliam na invasão da célula hospedeira. Esses parasitos podem ser encontrados em várias espécies de aves e outros animais como bovinos, suínos, equinos, etc. Entretanto, algumas espécies são capazes de parasitar o organismo humano, especificamente células epiteliais do intestino.(3)

As manifestações clínicas causadas por esses proto­zoários variam desde diarreia autolimitada, dor abdominal, dor de cabeça e febre em indivíduos imunocompetentes a morbidades decorrentes dessas para­sitoses, dentre as quais podem ser citadas alterações intestinais que geralmente culminam na síndrome da má absorção e, conse­quen­temente, podem causar desnutrição, perda de peso, anemia, diminuição no crescimento e retardo cognitivo na população afetada. Entretanto, em imuno­com­prometidos, pode ocorrer diarreia crônica associada a distúrbios eletro­líticos, podendo levar à morte do hospedeiro.(4)

Além da importância médica, a prevalência de infecções por parasitos intestinais também se traduz como um relevante indicador do status socioeconômico de uma determinada população e, na maioria das vezes, está associada a diversos fatores como condições sanitárias inadequadas, consumo de água e de alimentos contaminados por material fecal, fatores socioculturais, contato com animais, idade do hospedeiro e do tipo de parasito infectante.(5)

O Cryptosporidium parvum, coccídeo descrito inicialmente em camundongos, ganhou notoriedade nas décadas de 1970 e 1980 por ser considerado causa de doenças diarreicas em animais e humanos. Posteriormente, a criptosporidiose surgiu em todo o mundo como uma causa comum de infecção grave e potencialmente fatal em imuno­comprometidos.(4)

Até recentemente, acreditava-se que as infecções humanas eram causadas apenas pela espécie Cryptospo­ridium parvum, porém, com o avanço de métodos de geno­tipa­gem, um número crescente de espécies e genótipos foi reconhecido como patógenos humanos, embora com baixa prevalência. A classificação taxonômica do Cryptosporidium parvum tem sido modificada a partir da análise filogenética do gene codificador do RNA ribossô­mico 18S em diferentes isolados. Atualmente, 29 espécies de Cryptosporidium foram reconhecidas e mais de 17 já foram relatadas em humanos. Destas, o Cryptosporidium hominis e o C. parvum são as espécies mais comuns, seguidas pelo C. meleagridis, C. suis e C. felis. O encontro de tais espécies em humanos geralmente está associado ao contato com animais ou contaminação hídrica/alimentar, evidenciando o risco de transmissão zoonótica destes patógenos.(6)

O ciclo de vida dos coccídios intestinais completa-se dentro de um único hospedeiro (monoxênico). Ele envolve seis estágios de desenvolvimento (excistação, mero­gonia, gametogonia, fertilização, formação da parede do cisto e esporogonia), o que caracteriza o ciclo dos coccídios intestinais. Os oocistos de parede delgada de Cryptosporidium sp. acabam por se romper ainda no organismo do hospedeiro, liberando esporozoítos que invadem novas células. Esse processo possibilita a autoin­fec­ção nesse tipo de parasitismo.(7)

Apesar de apresentarem as mesmas vias de transmissão se comparados a Cryptosporidium sp. (alimentos ou fonte de água contaminados), Cyclospora cayetanensis e Cystoisospora belli possuem o homem como único hospedeiro e reservatório. Isso faz com que as taxas de transmissão desses parasitos sejam menores, se comparadas às do Cryptosporidium, uma vez que este último é capaz de infectar diversas espécies de animais como bovinos, cães e gatos, tornando-os disseminadores do parasito no ambiente.(8)

O Cyclospora cayetanensis foi descrito pela primeira vez em 1979 como um agente causador de infecção em humanos.(9) Outra grande diferença entre o Cryptosporidium e as demais espécies aqui relatadas (Cyclospora cayetanensis e Cystoisospora belli) é que os oocistos destes últimos, ao serem eliminados nas fezes, se encontram em estado não esporulado. Considerando que o tempo de permanência do oocisto no ambiente é de fundamental importância para a esporulação do mesmo, autoinfecções ou transmissão direta (pessoa a pessoa) raramente ocorrem, tornando a ingestão de água e/ou alimentos contaminados a principal forma de transmissão dessas infecções.(7)

Embora no gênero Cystoisospora haja centenas de espécies descritas como causadoras de infecções em mamíferos, a espécie Cystoisospora belli é a mais importante clinicamente para o ser humano.(10)

 

Caráter oportunista

 

Infecções oportunistas são consideradas comuns em pacientes com HIV/AIDS e estão relacionadas à alta morbidade nessa população. O Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) induz um estado imunodeficiente tornando o indivíduo vulnerável e favorecendo a infecção por entero­parasitas. Vale ressaltar que esses parasitos não são considerados oportunistas apenas nesses indivíduos, mas também em imunocomprometidos em geral, como transplantados, leucêmicos e em pacientes em tratamento quimio­terápico.

A coinfecção do HIV com infecções parasitárias possui grande importância, uma vez que, nestas circunstâncias, ocorre o recrudescimento da deterioração do sistema imunológico do indivíduo. Segundo Barcelos et al.,(1) em um estudo que avaliou a prevalência de parasitoses intestinais em pacientes portadores do HIV/AIDS atendidos no Serviço de Atendimento Especializado de Jataí, Goiás, pacientes com HIV/AIDS têm 11,42 vezes mais chances de desenvolver infecções parasitárias do que indivíduos saudáveis.

Com a pandemia do HIV/AIDS, muitos parasitas intestinais, antes considerados infecções esporádicas ou zoonóticas, benignas ou assintomáticas em indivíduos imunocompetentes, de forma oportunista tornaram-se agressivos, causando doenças debilitantes nesses pacientes. Dentre os sintomas apresentados, os quadros de diarreia crônica são os mais significativos. Desta forma, percebe-se que a infecção pelo HIV predispõe o indivíduo a infecção/doença por vários parasitas intestinais, sendo Cryptosporidium parvum, Cystoisospora belli, Cyclospora cayetanensis e microsporídios intestinais os mais relatados como oportunistas e causadores de diarreia crônica nesses pacientes.(11)

Em sua revisão de literatura, Collinet-Adler e Ward(12) confirmaram que o Cryptosporidium sp. é prevalente em todo o mundo, apresentando taxas diferentes de acordo com o desenvolvimento socioeconômico de cada país. A infecção varia de 0,26%-22% (média de 2,2%) em indivíduos imunocompetentes sintomáticos e de 6%-70% (média de 14%) em imunocomprometidos em países desenvolvidos. Já em países em desenvolvimento, as taxas variam de 1,4% a 40,9% (média de 6,1%) em imuno­com­petentes sintomáticos e de 8,7% a 48% (média de 24%) em imunocomprometidos. Em pacientes HIV positivos, taxas entre 6%-70% (média de 14%) foram encontradas em países desenvolvidos versus 8,7%-48% (média de 24%) em países em desenvolvimento.

 

Caráter zoonótico

 

Os sinais clínicos da criptosporidiose em cães e gatos podem variar desde a ausência de sintomas até a ocorrência de gastrenterites; esses últimos geralmente são pouco frequentes e estão associados a condições de estresse e imunossupressão.(13) Lallo e Bondan,(14) ao analisarem amostras fecais de cães de um Hospital Veterinário de São Paulo, entre 2003 e 2004, observaram uma prevalência de Cryptosporidium parvum de 9,5% na população canina estudada. Na cidade de Lages, Santa Catarina, Marques et al.(15) encontraram 10% dos cães avaliados eliminando oocistos de Cryptosporidium spp. Esses trabalhos utilizaram técnicas específicas para detecção de coccídios (como coloração de esfregaços), além de métodos imunológicos e moleculares, atribuindo confiabilidade aos resultados encontrados. Esse resultado tem grande importância em termos de saúde pública, pois evidencia a circulação de tais espécies nessa cidade e o seu potencial zoonótico, uma vez que essas espécies já foram descritas em amostras fecais de adultos, crianças e em pacientes HIV positivos.(3)

O Cryptosporidium sp. é considerado uma das causas mais comuns de diarreia em bezerros de 4 a 30 dias, tornando o gado um importante reservatório e possibilitando a contaminação do ambiente com oocistos de espécies zoonóticas. Santín et al.(16) relataram que a maior preva­lência de infecção (45,8%) ocorre em bezerros com até 2 semanas de idade e que a infecção se deve à contaminação de pastos, estábulos, reservatórios de água ou pelos próprios animais.

 

Diagnóstico

 

O diagnóstico dos coccídios intestinais se baseia na identificação de oocistos desses protozoários presentes nas fezes do indivíduo. Devido à eliminação diária irregular dessas formas evolutivas, é altamente recomendado que a amostra fecal passe por processos de concentração (centrífugo-concentração ou flutuação) antes da realização dos esfregaços fecais. Além disso, recomenda-se a combinação entre as técnicas de concentração e coloração. Assim, colorações como de Ziehl-Neelsen(17) e suas variações também são frequentemente utilizadas e se baseiam na propriedade álcool-ácido resistência desses protozoários.

Os métodos de concentração e coloração utilizados na identificação de coccídios apresentam variações na capacidade de detecção. Foi o que Pacheco et al.(2) demonstraram em seu estudo quando foram comparadas três técnicas de coloração (Ziehl-Nelsen modificado, safranina e auramina) e dois métodos de concentração (sedimentação por centrifugação e formalina-acetato de etila). No estudo em questão, concluiu-se que a coloração de auramina mostrou a melhor qualidade para detecção microscópica de Cryptosporidium spp., no entanto, esta mesma coloração apresentou qualidade inferior na detecção de Cystoisospora belli, se comparada com Ziehl-Nelsen modificado e safranina. Segundo os autores, isso ocorreu devido à irregularidade da captação de fluorocromo pela população de oocistos de Cystoisospora belli, o que aumentou a dificuldade da visualização microscópica do parasita e sugeriu que os coccídios intestinais mais frequentes em humanos requerem o uso de variadas técnicas para a detecção adequada de todos eles.

Embora seja frequente o uso da técnica microscópica na rotina laboratorial, a mesma apresenta diversas limitações por requerer a execução de procedimentos de concentração; requerer um microscopista experiente na detec­ção de parasitas; demandar maior tempo para realização da análise; conter artefatos na amostra. Além disso, avaliando-se os dados supracitados da literatura, foi possível observar uma grande variação na performance dessas técnicas, o que evidencia a necessidade de uma maior padro­nização das mesmas no intuito de aumentar a repro­du­tibilidade dos resultados.

Diversos testes baseados em princípios imunológicos foram desenvolvidos para análise em amostras fecais. O ELISA (Enzyme Linked Immunosorbent Assay) oferece uma alternativa diagnóstica em substituição à microscopia, pois independe da identificação morfológica de oocistos por detectarem antígenos do parasito em questão. A Imuno­fluorescência Direta utiliza um anticorpo monoclonal contra proteínas específicas presentes na parede do oocisto do parasito. Esses testes apresentam vantagens, pois são bastante sensíveis e específicos, de fácil execução e podem permitir o processamento de mais de uma amostra em curto período de tempo.(18)

O diagnóstico rápido pode ser realizado por testes imunocromatográficos, que são considerados fáceis de executar e interpretar. Segundo Van den Bossche et al.,(19) eles podem se tornar uma importante ferramenta diag­nóstica quando o laboratório não dispõe de profissionais qualificados. Entretanto, apesar da maior eficiência diag­nóstica, no Brasil essas técnicas ainda não são rotineiras por serem mais onerosas.

Os métodos moleculares constituem um grupo de novas técnicas baseadas no reconhecimento molecular de um alvo específico do patógeno. Esses métodos contribuem com informações além das oferecidas pela micros­copia, pois são capazes de distinguir espécies e/ou genótipos. Assim, técnicas como a reação em cadeia da polimerase (PCR) e suas variantes possuem grande importância para investigação de surtos, epidemiologia, taxonomia, avaliação da carga parasitária e estudos de fatores de risco.(3) Entretanto, sua aplicação requer o uso de equipamentos modernos e necessita de alta competência técnica, tornando o custo mais elevado. Conse­quentemente, o seu uso no diagnóstico de rotina ainda é limitado, ficando restrito apenas no âmbito das pesquisas científicas.(20)

 

Ocorrência no Brasil

 

O primeiro trabalho registrando a ocorrência de crip­tosporidiose no Brasil, em humanos, foi realizado em 1985 e estava relacionado com pacientes com sintoma­tologia diarreica que não necessariamente apresentavam imuno­deficiência.(21) Posteriormente, o parasito tornou-se foco de pesquisas como ameaça aos indivíduos com HIV/AIDS, reconhecendo-se sua importância para a saúde pública.

Com o objetivo de estudar a ocorrência de infecções parasitárias intestinais em pacientes portadores do HIV, Silva et al.(22) submeteram dois grupos de indivíduos (100 pacientes com HIV/AIDS e 85 indivíduos clinicamente saudáveis) a exame coproparasitológico, onde se verificou que parasitas intestinais foram detectados em 27% dos pacientes com HIV/AIDS e em 17,6% dos indivíduos clinicamente saudáveis. Dentre os parasitas mais frequentes no grupo de portadores do HIV/AIDS, se encontravam Cystoisospora belli (7%) e Cryptosporidium sp. (4%).

Em várias regiões do mundo tem se observado um pico de incidência de criptosporidiose em crianças imuno­competentes, particularmente na faixa etária de 0-5 anos(2) e, no Brasil, as prevalências encontradas justificam esses relatos. Em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, um estudo retrospectivo revelou 20,0% de infecção por Cryptosporidium sp. em lactentes de 0 a 24 meses que apresentavam diarreia persistente.(23) Já em Maringá, no Paraná, Moitinho et al.(24) verificaram que o Cryptosporidium sp. foi o segundo agente parasitário mais frequente em amostras de fezes diarreicas de crianças, com idade entre 12 a 24 meses. Até o momento, a maior prevalência de infecção por Cryptosporidium sp. já registrada no Brasil foi observada na cidade de Criciúma, Santa Catarina, quando esse parasito foi o mais frequente (85,1%) dentre outros isolados a partir de amostras fecais de crianças com idade entre 0 e 5 anos.(25)

Apesar da infecção por Cryptosporidium estar associada a episódios diarreicos persistentes, Carneiro et al.,(26) ao analisarem amostras de fezes não diarreicas de crianças entre 0 a 5 anos, encontraram 2,73% (5/183) de positividade para oocistos de Cryptosporidium parvum. Esses achados permitem supor que a eliminação de oocistos não se encerra com o fim do quadro diarreico e, além disso, as crianças assintomáticas passam a atuar como importantes disseminadoras da doença.

Ao se analisarem os trabalhos na literatura, é possível observar a existência de diferenças significativas entre as frequências de Cryptosporidium sp. encontradas. Isso pode ocorrer por vários fatores, como grau de desenvolvimento em cada região, características das diferentes populações e metodologias empregadas no processamento das amostras. Gomes et al.,(27) ao compararem técnicas moleculares com os métodos imunológicos e parasi­to­ló­gicos para a detecção de oocistos de Cryptosporidium, observaram que o método molecular possibilitou o encontro de amostras positivas que haviam sido classificadas como negativas pelas outras técnicas. Isto corrobora a sugestão de alguns estudos de que a prevalência é subestimada e que essas taxas provavelmente serão maiores caso técnicas moleculares sejam utilizadas para a detecção.

Se comparado com o Cryptosporidium, poucos estudos abordam a infecção causada por Cystoisospora belli e Cyclospora cayetanensis. Esses protozoários raramente causam infecção em indivíduos imunocompetentes, no entanto, são considerados como uma das principais causas de diarreia em indivíduos portadores do HIV/AIDS. No Brasil, a prevalência de cistoisosporose entre pacientes infectados pelo HIV varia de 4,4% a 18%.(22)

O caráter oportunista dessa infecção foi demonstrado no estudo de Assis et al.(28) quando oocistos de Cystoisospora belli foram encontrados em 6,7% (5/59) das amostras fecais de pacientes HIV positivos, apresentando frequência maior entre pacientes com síndrome diarreica e contagem de linfócitos T CD4+ < 200 células/mm3.

O primeiro surto de diarreia associado à Cyclospora notificado e investigado no Brasil ocorreu no ano 2000, na cidade de General Salgado, São Paulo.(29) Entretanto, devido aos poucos casos e surtos relatados, a prevalência da ciclosporíase no Brasil ainda é indeterminada.

 

 

 

 

CONCLUSÕES

 

As coccidioses intestinais ainda constituem um grave problema de saúde pública nos dias atuais. Tal situação é observada, principalmente, em países em desenvolvimento onde os baixos níveis socioeconômicos e a falta de saneamento contribuem para o desenvolvimento e propagação dos parasitas.

Apesar de os coccídios intestinais acometerem indivíduos de qualquer faixa etária, pôde-se observar que, no Brasil, há uma alta prevalência dessas parasitoses em crianças saudáveis de 0 a 5 anos e em indivíduos imuno­comprometidos. Por evoluir para formas mais graves da doença, percebe-se que as coccidioses devem ser consideradas no diagnóstico diferencial de crianças com doença diarreica, especialmente para as que frequentam creches, assim como faz-se necessária uma vigilância ativa em pacientes portadores de HIV que envolva práticas de segurança alimentar.

Neste trabalho, observou-se uma maior riqueza de dados referentes à criptosporidiose. Isso pode ser justificado pelo caráter zoonótico dessa parasitose e pela maior prevalência. Além disso, ficou evidente que os estudos de prevalência no Brasil são pontuais e se restringem à população infantil e portadores do HIV, não existindo inquéritos mais amplos que forneceriam a real amplitude das infecções.

No Brasil, apesar de poucos estudos abordarem o tema, espécies de Cryptosporidium com potencial zoonó­tico já foram identificadas em diversos animais. Apesar do Cryptosporidium sp. ser um agente causador de diarreia em cães e gatos, já foi demonstrado que esses animais podem não apresentar sintomas, dificultando o diagnóstico da doença. Isso reforça a necessidade de se adotar uma abordagem específica para coccídios na rotina veterinária.

Apesar do advento de diversas técnicas que aumentaram significativamente a sensibilidade e especificidade dos métodos, o custo elevado impede a aplicação dessas novas abordagens diagnósticas na rotina laboratorial. Assim, maiores investimentos poderiam ser realizados nesse setor, além de ações conjuntas de políticas governamentais com o auxílio da população, uma vez que o controle e diagnóstico precoce dessas parasitoses reduzem os impactos econômicos e os custos decorrentes de internação/tratamento de pacientes afetados.

 

 

 

Abstract

Intestinal coccidia comprise a group of emerging and opportunistic protozoa. The manifestations caused may range from diarrhea to chronic variables associated with electrolytic disturbances. With an HIV / AIDS pandemic, these infections can be reported because of the aggressive picture in patients. The data of the literature, in HIV positive patients were 24 mm of average of 24%. Among the intestinal coccidia, Cryptosporidium sp. is more prominent due to its zoonotic nature. Recovery records of dogs and cats were found in 100% of treated animals in a veterinary hospital. In addition, cattle may also act as reservoirs, with prevalences in Brazil varying from 0.6% to 72.13%. Currently, there are several methodologies for the diagnosis of these coccidians, from the microscopic methods that present the main techniques for the diagnosis of these coccidians. In addition to the medical importance, the prevalence of intestinal coccidioses is relevant as an indicator of the socioeconomic status of a given population and the intensity of energy is an anthropopathic or zoonotic. However, improvements are still needed to make new diagnostic techniques more accessible, in order to detect intestinal coccidia more easily and reliably.

 

Keywords

Diagnosis; HIV; parasites; host-parasite interactions

 

 

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