Avaliação de parâmetros hematológicos na dengue: uma revisão

Evaluation of hematological parameters in dengue: a review

 

 

Thales Eduardo Nass Lajus1, Vitor Antunes de Oliveira1, Matias Nunes Frizz1

 

1  Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ, Ciências da Vida. Ijuí, RS, Brasil.

 

 

Recebido em 28/12/2023

Aprovado em 16/01/2024

DOI: 10.21877/2448-3877.202400160

 

INTRODUÇÃO

 

A dengue tem se destacado entre as enfermidades reemergentes e é considerada a mais importante das doenças virais transmitidas por artrópodes, sendo também a mais comum e distribuída arbovirose no mundo. A doença manifesta-se, clinicamente, sob duas formas principais: a dengue clássica (também chamada febre de dengue) e a forma hemorrágica, ou febre hemorrágica de dengue (FHD), às vezes com síndrome de choque de dengue (SCD).(1)

Em 2023, as Américas registraram um aumento acentuado nos casos de dengue. Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), mais de 3 milhões de novas infecções foram registradas até o mês de agosto de 2023, as quais já superam os números de 2019, o ano com a maior incidência registrada da doença.(2) O Brasil é o país mais afetado, com 2,3 milhões de notificações, das quais mais de 1 milhão foram confirmadas e 1,2 mil classificadas como dengue grave e 769 óbitos. Comparado aos anos anteriores, o país apresenta um aumento de 73% em relação à média dos últimos cinco anos.(3)

Em pacientes infectados, o tratamento é apenas sintomático, não havendo nenhum tratamento farmacológico específico para o vírus. Clinicamente os sintomas mais característicos da forma hemorrágica são dificuldade respiratória resultante do vazamento de plasma, sangramento grave, comprometimento de órgãos, podendo levar ao óbito. Já na dengue clássica, a maioria dos pacientes apresenta febre alta, dor de cabeça intensa, dores musculares e nas articulações, náusea, dor atrás dos olhos e erupções cutâneas, ressaltando-se que como esta sintomatologia cessa em até duas semanas.(3) No entanto, os quadros graves são acompanhados de maior taxa de mortalidade, a qual também está associada a comorbidades subjacentes, sendo as principais: diabetes, doenças autoimunes, respiratórias e hipertensão.(4)

A doença cursa laboratorialmente com alterações qualitativas e quantitativas nos três elementos celulares do sangue, assim como promove alterações nos parâmetros bioquímicos do plasma sanguíneo, direcionado para intervenções terapêuticas.(5,6) Cabe destacarmos que a ausência de tratamentos específicos para dengue denota ainda mais a importância da avaliação laboratorial dos pacientes a fim de que possibilitem não somente o diagnóstico (já bem estabelecido pelo teste de RT-qPCR e de antígeno), mas sobretudo os biomarcadores para o monitoramento e prognóstico dos pacientes.(3)

Nesse sentido, destacamos os parâmetros hematológicos eritrocitários, leucocitários, plaquetários, assim como os constituintes bioquímicos da fração plasmática, analitos que podem ser de grande relevância para avaliar a patogênese e os agravos da dengue.(4) A introdução de exames laboratoriais de hematologia e bioquímica na rotina de avaliação de pacientes com dengue pode auxiliar tanto no diagnóstico precoce como no monitoramento, prognóstico e desfechos da doença. Dessa forma, o presente estudo tem como objetivo descrever e sistematizar as principais alterações clínicas e laboratoriais na dengue, assim como avaliar sua aplicabilidade no prognóstico da doença.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

 

O presente estudo foi desenvolvido na forma de uma revisão bibliográfica integrativa de literatura, sendo que para o levantamento dos artigos científicos realizou-se uma busca nas bases de dados: PubMed, Scientific Electronic Library Online (SciELO), Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline) e Bibliografia cinzenta. Foram utilizados, para busca dos artigos, os seguintes descritores e suas combinações nas línguas portuguesa (arbovírus; dengue; hemograma; prognóstico) e inglesa (arbovirus; dengue; blood count; prognosis); adicionalmente, também foi citado o termo hemostasia (hemostasis).

Os critérios de inclusão definidos para a seleção dos artigos foram artigos publicados em português, inglês e espanhol que abordem a temática referente à revisão integrativa, publicados nos últimos cinco anos; a pesquisa e seleção de artigos foram realizadas de 2013 a 2023.

A análise dos estudos selecionados, em relação ao delineamento de pesquisa, e a síntese dos dados extraídos dos artigos foram realizadas de forma descritiva, possibilitando observar, descrever e classificar os dados, com o intuito de reunir o conhecimento produzido sobre o tema explorado na revisão.

Após a busca pelos descritores a amostra inicial foi de 287 artigos científicos, coletados junto a PubMed, Scientific Electronic Library Online (SciELO) e Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline). Destes 287 artigos, foi realizada a leitura do título e resumo, sendo excluídos 244 artigos. Ao final foram avaliados por leitura na íntegra 36 artigos, dos quais 21 foram selecionados para esta revisão, conforme demonstra a Figura 1.

 

 

Figura 1

Fluxograma de análise dos artigos encontrados.

Fonte: Própria dos Autores (2023).

 

 

 

RESULTADOS

 

Após a seleção, leitura e análise dos artigos, estratificamos os 21 artigos em 5 categorias relacionadas com alterações hematológicas na dengue e suas aplicabilidades no diagnóstico e prognóstico: 1) Trombocitopenia como biomarcador diagnóstico e prognóstico de dengue (13 estudos – 62%); 2) Leucopenia e alterações em contagens absolutas de leucócitos no diagnóstico e prognóstico de dengue (11 estudos – 52%); 3) Hemoconcentração e alterações em índices hematimétricos como preditores de formas de dengue grave (5 estudos – 24%); 4) Alterações nas enzimas hepáticas como biomarcadores preditivos de dengue grave (5 estudos – 24%) e 5) Parâmetros clínicos como preditores de dengue e dengue grave (4 estudos – 19%). Os artigos selecionados e analisados estão apresentados no Quadro 1.

 

 

Quadro 1

Sistematização dos artigos incluídos na revisão integrativa de acordo com título, autor e ano de publicação, objetivos, principais resultados e conclusões.

Título Categoria Autor(es)/ Ano Objetivo Métodos Resultados Conclusão
Prognostic indicators associated with progresses of severe dengue.⁵ 1 e 4. Huy et al. 2022. Avaliar os indicadores prognósticos de dengue grave de acordo com as fases da evolução da doença. Estudo transversal realizado de julho a dezembro de 2017 no Hospital Nacional de Doenças Tropicais e no Hospital de Doenças Tropicais da cidade de Ho Chi Minh.

Foram avaliadas as manifestações clínicas e os parâmetros laboratoriais hematológicos e bioquímicos.

Nos primeiros 3 dias da doença, os biomarcadores   prognósticos para casos de dengue grave foram contagem de plaquetas ≤ 100 mil/mm3 (OR = 2,2; IC 95%: 1,2 a 3,9) e albumina sérica < 35 g/L (OR = 3,3; IC 95%: 1,8 a 6,1).

No período do 4º ao 6º dia, os biomarcadores para a dengue grave foram AST > 400 U/L (OR = 3,0; 95% CI: 1,1 a 7,9), ALT > 400 U/L (OR = 6,6; 95% CI: 1,7 a 24,6), albumina < 35g/L (OR = 3,0; IC95%: 1,5 a 5,9) e bilirrubina total > 17 μmol/L (OR = 4,6; IC 95%: 2,0-10,4).

Os indicadores para dengue durante os primeiros 3 dias devem ser a contagem de plaquetas ou a albumina sérica. A partir do 4º ao 6º dia de doença, os indicadores prognósticos devem ser AST, ALT, albumina ou bilirrubina total.
Factors associated with thrombocytopenia in patients with dengue fever: a retrospective cohort study.6 1 e 2. Castilho et al. 2020. Identificar fatores associados a um risco aumentado de trombocitopenia e alterações hematológicas em pacientes com dengue confirmada. Foram incluídos todos os casos notificados e registrados de dengue no SINAN de Campinas, estado de São Paulo, no período de janeiro a dezembro de 2014.  A confirmação laboratorial positiva de dengue foi de acordo com os resultados NS1, sorologia IgM/IgG ou IgM ELISA. Critério para trombocitopenia foi uma contagem de plaquetas <150×109 /L em dois testes. Foram avaliados 387 pacientes, dentre os quais 156 tinham dengue e trombocitopenia.

Os fatores de risco associados à trombocitopenia na dengue foram sexo masculino (OR: 1,77, IC 95%: 1,16 a 2,71, p=0,007); idade de 46 a 64 anos (OR: 2,20, IC 95%: 1,15 a 4,21, p=0,009) ou ≥65 anos (OR: 3,02, IC 95%: 1,40 a 6,50, p=0,002); presença de leucopenia (OR: 6,85, IC 95%: 4,27 a 10,99, p<0,001) e elevação na hemoglobina corpuscular média (HCM) níveis (OR: 2,00, IC 95%: 1,29 a 3,12, p=0,005).

Idade avançada, sexo masculino, presença de leucopenia e níveis elevados de HCM foram identificados como fatores de risco associados ao desenvolvimento de trombocitopenia nessa população.
The value of daily platelet counts for predicting dengue shock syndrome: Results from a prospective observational study of 2301 Vietnamese children with dengue.7 1. Lam et al. 2017. Avaliar o valor prognóstico dos níveis diários de hematócrito e contagem de plaquetas. Estudo observacional prospectivo de crianças vietnamitas com idades entre 5 e 15 anos internadas com suspeita clínica de dengue no Hospital de Doenças Tropicais da cidade de Ho Chi Minh entre 2001 e 2009. Entre as 2.301 crianças incluídas na análise, 143 (6%) progrediram para DSS.

Modelos de predição que incluíram contagens seriadas diárias de plaquetas demonstraram melhor capacidade de discriminar pacientes que desenvolveram DSS de outros, em vez de modelos baseados apenas em informações de matrícula.

O monitoramento diário da contagem de plaquetas é importante para identificar pacientes com alto risco de DSS.
Variable selection methods for developing a biomarker panel for prediction of dengue hemorrhagic fever.8 1. Hyunsu et al. 2013. Avaliar características clínicas e laboratoriais de infecções graves por dengue. Estudo observacional prospectivo de infecções agudas por dengue em humanos.  Comparamos os resultados da seleção de variáveis e Regressão nos pacientes com dengue. Os resultados sugerem que a contagem de IL-10 , plaquetas e linfócitos são as principais características para prever a DHF da dengue com base na química do sangue e nas medições de citocinas . Dosagem de IL-10  e contagem de plaquetas e linfócitos são as principais características para prever a dengue grave.
Brote epidémico de dengue en la Ciudad de Buenos Aires, 2016: características clínicas y hematológicas de la infección en una población pediátrica.9 2 e 5. Cazes et al. 2019. Descrever as características clínicas e hematológicas em uma população pediátrica . Estudo transversal que incluiu pacientes atendidos no Hospital Infantil “Dr. Ricardo Gutiérrez” . Foram registrados 156 casos, sendo 82 confirmados e 130 (83%) autóctones.

As manifestações clínicas mais frequentes foram febre, cefaleia e dor retro-ocular.

Anormalidades laboratoriais mais significativas foram leucopenia, trombocitopenia e aumento de transaminases.

O controle hematológico é essencial para detectar em crianças o risco de complicações da doença, bem como oferecer um tratamento de suporte mais  precocemente.
Association of Hematological and Biochemical Parameters with Serological Markers of Acute Dengue Infection during the 2022 Dengue Outbreak in Nepal¹⁰ 1, 2 e 4. Bibek et al. 2023. Avaliar os parâmetros hematológicos e bioquímicos preditivos em cada fase sorológica da infecção por dengue (NS1 e IgM). Estudo transversal de base laboratorial em pacientes com dengue.

O antígeno (NS1) e o teste sorológico (IgM/IgG) foram realizados para diagnosticar casos positivos de dengue. Também investigaram alterações hematológicas e bioquímicas comparadas entre participantes NS1 e/ou IgM-positivos.

 

Os resultados demonstraram que trombocitopenia (OR A = 1,000; p = 0,001), glicemia (OR A = 1,037; p= 0,004) e aspartato aminotransferase (OR A = 1,141; p < 0,001) foram significativos em pacientes para predizer a doença em pacientes com diagnóstico via sorologia e NS1.

Além disso, trombocitopenia (OR A = 1,000; p < 0,001), leucopenia (OR A = 0,999; p < 0,001), glicose (OR A = 1,031; p = 0,017), aspartato aminotransferase (OR A = 1,136; p < 0,001), e linfopenia (OR A = 0,520; p= 0,067) foram preditores independentes nos grupos NS1 + IgM positivos.

As plaquetas demonstraram consistentemente uma maior área sob a curva com sensibilidade e especificidade aumentadas em todos os modelos. A contagem total de leucócitos teve melhor desempenho quando ambos NS1 + IgM foram positivos (AUC = 0,814).

Trombocitopenia, AST elevado, alto nível de glicose, leucopenia com monocitose e leucopenia com linfopenia podem prever o diagnóstico de dengue e sua gravidade durante uma infecção ativa.
Dengue Fever: Prognostic Insights From a Complete Blood Count.¹¹ 1 e 2. Amogh et al. 2020. Investigar o valor de um hemograma na determinação do prognóstico da dengue. Estudo retrospectivo de todos os pacientes internados nos hospitais Chigateri General e Bapuji, Davangere durante dois meses.

Foram avaliados 56 pacientes e coletadas as informações clínicas e laboratoriais.

Trombocitopenia foi a característica hematológica mais comum, em 50 casos (~90%), seguida de leucopenia em 43 casos (~76%). O hemograma pode funcionar como um biomarcador precoce e prognóstico.

 

Alterações hematológicas na dengue grave: ­ uma revisão sistemática.¹² 1, 2 e 3. Portilho et al. 2022. Avaliar os resultados de características hematológicas nos casos de dengue grave. Revisão da Literatura – Sistemática. Frequência das alterações hematológicas encontradas nos estudos avaliados.

Trombocitopenia 66,7%, leucopenia 26,6%, hematócrito aumentado 26,6%, hematócrito baixo 20%, Alto grau de hemoconcentração 6,6%, Tempo de protrombina aumentado 13,3%, linfocitose atípica 6,6%, monocitose 6,6%, Coombs indireto positivo 6,6%, Dímero D ligeiramente elevado 6,6%, Contagem normal de plaquetas com manifestações hemorrágicas 6,6%.

A diminuição na contagem de plaquetas, aumento do hematócrito, aumento do tempo de tromboplastina parcial ativada e leucopenia são as alterações mais frequentes na dengue grave.
Predictive markers for the early prognosis of dengue severity: A systematic review and meta-analysis.13 1 e 4. Thach et al. 2021. Identificação de marcadores que permitam prever o prognóstico da doença a partir do diagnóstico inicial. Revisão da Literatura –  sistemática e metanálise. Dos 4.000 registros encontrados, 40 estudos para síntese qualitativa, 19 para metanálise. Evidências de qualidade moderada indicaram contagens de plaquetas significativamente mais baixas (SMD -0,65, IC 95% -0,97 a -0,32) e níveis mais elevados de AST (SMD 0,87, IC 95% 0,36 a 1,38) em casos graves quando comparados com dengue não grave durante esta janela de tempo. Alterações na contagem de plaquetas e no nível de AST – nas primeiras 72 horas do início da febre – são marcadores independentes que predizem o desenvolvimento de dengue grave.
Dengue hemorrhagic fever: comparison of patients with primary and secondary infections.14 1 e 4. Khurram et al. 2014. Observar a frequência de infecção primária e secundária por dengue em pacientes com ICD. Estudo observacional transversal, com pacientes com positividade de IgG e IgM específicas para dengue.

Grupo I, infecção secundária por dengue.

Grupo II, infecção primária.

Os dois grupos foram comparados idade, sexo, parâmetro laboratorial.

Duzentos e trinta e quatro pacientes com ICD foram incluídos.

66,2% eram homens e 33,8%, mulheres.

A idade média dos pacientes foi de 28,8 ± 12,4 anos.

61,5% dos pacientes foram categorizados no Grupo I e 38,5% no Grupo II.

Associação na contagem de plaquetas na admissão e valor de ALT, valor de P <0,05.

Tanto em infecção primária quanto em secundária por dengue apresentam contagens plaquetárias mais baixas na admissão e valores mais elevados de ALT.
Leucopenia e trombocitopenia no diagnóstico da dengue.15 5. Barbosa et al. 2018. Demonstrar as alterações hematológicas em pacientes com diagnóstico de dengue. Trata-se de um estudo descritivo e exploratório, com abordagem de caráter quantitativo e qualitativo. Foram analisados 88 hemogramas de pacientes com resultado de pesquisa de antígeno NS1 positivos.

Foram significativamente associadas à diminuição na contagem de plaquetas e de leucócitos com a infecção e gravidade da doença.

O hemograma, na dengue,  fornece dados importantes para o acompanhamento da evolução e a cura da doença.
Early transcriptomic host response signatures in the serum of dengue patients provides insights into clinical pathogenesis and disease severity.16 5. Yadav et al. 2023. Avaliar o espectro diversificado de manifestações clínicas na infecção por dengue.  Uma abordagem baseada em sequenciamento duplo de RNA (RNA-Seq) a partir de amostras de soro de pacientes infectados por dengue. Os resultados produzem, assim, as assinaturas transcricionais iniciais que discriminaram os pacientes com leituras virais altas dos pacientes com leituras virais baixas da dengue.

Identificamos uma regulação positiva significativa de dois conjuntos de genes, genes-chave relacionados a antivirais (IFIT3, RSAD2, SAT1) e disfunção vascular (TNFS10, CXCL8) no grupo de leituras virais altas.

 

Um aprofundamento do perfil genético evidenciou a resposta bidirecional, na qual genes antivirais podem mediar o curso da doença para leve. Ao contrário, o aumento da expressão do outro conjunto de genes pode atuar como indicadores do curso grave da doença.
A novel predictor of severe dengue: The aspartate aminotransferase/platelet count ratio index (APRI).17 2 e 4. Zhang et al.2018. Avaliar os fatores de risco para o desenvolvimento da dengue em dengue grave em Guangdong. Análise retrospectiva de dados clínicos de 212 pacientes com dengue entre junho e outubro de 2014. Os resultados dos exames laboratoriais de rotina, alanina aminotransferase, aspartato aminotransferase, albumina, contagem de leucócitos, contagem de plaquetas, tempo de protrombina parcial ativada, tempo de protrombina e índice de relação aspartato aminotransferase / contagem de plaquetas mostraram associação significativa com dengue grave Exames laboratoriais como WBC, PT e APRI identificaram pacientes com risco de desenvolver dengue grave.
Platelets and infections in the resource-limited countries with a focus on malaria and viral haemorrhagic fevers.18 1. Thachil. 2017. Avaliar a relevância das plaquetas em infecções. Revisão da Literatura –  sistemática. Uma melhor compreensão da fisiopatologia e do papel das plaquetas, em particular nessas condições, provavelmente se traduzirá em melhores cuidados ao paciente e, assim, reduzirá a morbidade e a mortalidade. A trombocitopenia é uma das manifestações mais comuns em todas estas infecções e pode ser utilizada como um indicador prognóstico e marcador facilmente disponível para a gravidade das infecções.
The diagnostic and prognostic value of dengue non-structural 1 antigen detection in a hyper-endemic region in Indonesia.19 1. Kosasih et al. 2013. Avaliar a sensibilidade do ensaio de antígeno Dengue NS1. Foram testados soros agudos de 220 indivíduos com dengue confirmada e 55 indivíduos com doença febril não relacionada à dengue usando o ensaio de antígeno NS1 da dengue da Bio-Rad. A sensibilidade global do ELISA NS1 foi de 46,8% e a especificidade foi de 100%. A sensibilidade nas infecções primárias foi significativamente maior do que nas infecções secundárias (100% vs. 35,7%). Nas infecções secundárias, a sensibilidade da detecção de NS1 foi maior em infecções por DENV-3 (47,1%), seguida por infecções por DENV-1 (40,9%), DENV-2 (30%) e DENV-4 (27%). A NS1 foi detectada com menos frequência em soros com títulos elevados de anticorpos. A detecção de NS1 foi maior em mulheres, casos graves e indivíduos com menor contagem de plaquetas (<100.000/mm3). Em infecções secundárias, a detecção pode ser preditiva de uma doença mais grave.
Platelets in dengue infection: more than a numbers game.20 1. Quirino et al. 2021. Avaliar as alterações no número e função plaquetária, levando à trombocitopenia. Revisão da Literatura –  sistemática. As plaquetas de pacientes com dengue secretam citocinas e quimiocinas e também aderem ao endotélio vascular ativado.

As plaquetas agregam-se aos leucócitos, induzindo a secreção de NETs e mediadores inflamatórios por neutrófilos e monócitos, respectivamente.

O vírus da dengue infecta diretamente células estromais e precursores hematopoiéticos, incluindo megacariócitos, o que compromete a megacariopoiese.

Os mecanismos centrais e periféricos da dengue promovem trombocitopenia.
Complicaciones asociadas a trombocitopenia severa en pacientes con dengue.21 1. Lovera et al. 2020. Determinar a relação entre a contagem de plaquetas e a gravidade da dengue em crianças. Crianças com menos de 15 anos internadas com diagnóstico de dengue entre os anos de 2007 a 2018 foram avaliadas quanto à contagem de plaquetas e gravidade da doença.

Os pacientes foram divididos em 2 grupos: contagem de plaquetas acima ou abaixo de 100.000/mm3.

Foram incluídos no estudo 882 pacientes internados com dengue, com idade média de 9,7±4,6 anos, e distribuição igualitária por sexo: 437 (49,5%) do sexo feminino e 445 (50,5%) do sexo masculino.

62,4% (550 pts) apresentaram plaquetas ≤100.000/mm3.

A gravidade da dengue é maior em pacientes com <100.000/mm3 plaquetas, sendo as complicações da doença em decorrência deste achado.

 

Characterization of thrombocytopenia, leukopenia and increased hematocrit in the evolution and severity of patients with dengue diagnosis.22 1, 2 e 3. Ortega et al. 2021. Caracterizar a presença de trombocitopenia, leucopenia e aumento do hematócrito com a evolução e gravidade dos pacientes com dengue, no Hospital Univalle, na cidade de Cochabamba, Bolívia. Estudo retrospectivo, longitudinal e analítico, de 2017 a 2020. Foram identificados 235 pacientes, 83% em 2020; 65% entre 19 a 45 anos; 54% do sexo masculino, 80% provêm do Cercado-Cochabamba, sendo mais de 95% da zona sul .

Dentro da classificação da dengue, 75% pertenciam à dengue sem sinais de alarme (p = 45% em homens, apresentando mais de 5 dias de internação (p = 0,023).

Trombocitopenia, leucopenia e hematócrito aumentado são biomarcadores de gravidade clínica e de internação, associados ao diagnóstico precoce, utilizando os sintomas e testes rápidos disponíveis.
Clinicopathological Profile of Dengue Infection in a Tertiary Care Centre in Nepal.23 1, 2 e 5. Thapa et al. 2023. Explorar o perfil clinicopatológico da infecção por dengue. Um total de 84 casos de dengue confirmados sorologicamente foi categorizado como dengue sem sinais de alerta, dengue com sinais de alerta e dengue grave. As informações clínicas e patológicas foram registradas por meio da revisão dos prontuários dos pacientes. Dos 84 pacientes, 76% (64) eram dengue sem sinais de alerta, 21,4% (18) eram dengue com sinais de alerta e 2,4% (2) eram dengue grave .

Cerca de 97,6% (82) apresentaram febre. Durante o curso da doença, anemia foi identificada em 38,1% (32), trombocitopenia em 65,5% (55), hemoconcentração em 6% (5) e leucopenia em 82,1% (69).

A gravidade da dengue na apresentação ao hospital foi significativamente associada com trombocitopenia, leucopenia e ALT elevada e hemoconcentração.

A apresentação mais comum da infecção por dengue foi a febre .

As anormalidades laboratoriais mais comuns foram leucopenia, trombocitopenia, hemoconcentração, anemia e enzimas hepáticas elevadas.

Early hematological parameters as predictors for outcomes in children with dengue in northern India: A retrospective analysis.24 1 e 2. Nandwani et al. 2021. Avaliar a capacidade de parâmetros hematológicos observados no início do curso da doença para prever os resultados clínicos da doença. Analisamos os registros de crianças internadas nos serviços de internação pediátrica com dengue entre 2017 e 2019. Determinamos as relações entre os parâmetros hematológicos observados durante a primeira avaliação e os vários desfechos clínicos. Foram avaliados dados de 613 pacientes (faixa etária, 26 dias a 17 anos). Destes, 29,85% apresentaram febre com sinais de alerta e 8,97% apresentaram dengue grave.

Valores mais baixos de hemoglobina, contagem de plaquetas, volume corpuscular médio, concentração média de hemoglobina corpuscular e volume médio de plaquetas, e valores mais altos de contagem total de leucócitos, hematócrito e amplitude de distribuição de glóbulos vermelhos foram associados com dengue e agravos.

A leucometria inicial alta associada com a baixa contagem de plaquetas são preditores potenciais de desfechos fatais no curso da doença.
The diagnostic and prognostic value of dengue non-structural 1 antigen detection in a hyper-endemic region in Indonesia.25 1. Kosasih et al. 2013. Avaliar a sensibilidade do ensaio de antígeno Dengue NS1. Foram testados soros agudos de 220 indivíduos com dengue confirmada e 55 indivíduos com doença febril não relacionada à dengue usando o ensaio de antígeno NS1 da dengue da Bio-Rad. A sensibilidade global do ELISA NS1 foi de 46,8% e a especificidade foi de 100%. A sensibilidade nas infecções primárias foi significativamente maior do que nas infecções secundárias (100% vs. 35,7%). Nas infecções secundárias, a sensibilidade da detecção de NS1 foi maior em infecções por DENV-3 (47,1%), seguida por infecções por DENV-1 (40,9%), DENV-2 (30%) e DENV-4 (27%). A NS1 foi detectada com menos frequência em soros com títulos elevados de anticorpos. A detecção de NS1 foi maior em mulheres, casos graves e indivíduos com menor contagem de plaquetas (<100.000/mm3). Em infecções secundárias, a detecção pode ser preditiva de doença mais grave.
Perfil hematológico de idoso com dengue internado em Unidade de Terapia Intensiva. 1 e 3. Silva et al. 2023. Avaliação hematológica de um paciente hospitalizado na Unidade de Terapia Intensiva na cidade de Umuarama-PR. Estudo descritivo retrospectivo, do qual foram analisados os resultados de hemogramas obtidos por um laboratório local, considerando que o paciente constava como sorologia positiva para NS1 Com base na análise dos hemogramas pode-se verificar a redução do hematócrito em 33,33%, macrocitose em 88,9%, leucopenia em 27,3%, trombocitopenia em 27,3%. Conclui-se que através dos laudos avaliados foram encontrados plaquetopenia, leucopenia, linfocitopenia, eosinopenia, neutropenia, monocitopenia, o que evidencia o hemograma como uma ferramenta laboratorial de grande auxílio na avaliação do paciente.

Fonte: Própria dos Autores (2023).

 

 

DISCUSSÃO

 

A dengue é uma condição caracterizada por um curso clínico altamente variável, que pode ir desde sintomas leves até manifestações graves, incluindo hemorragia e choque, representando uma ameaça potencialmente fatal. A confirmação laboratorial das infecções pelo vírus da dengue é obtida através do isolamento do agente (teste de RT-PCR ou de antígeno – NS1) ou pelo uso de métodos sorológicos, como a detecção de anticorpos da classe IgM em uma única amostra de soro. A identificação de indicadores laboratoriais prognósticos que estejam em concordância com a evolução da doença desempenha um papel fundamental na previsão do risco de desenvolvimento de dengue grave. O conhecimento desses parâmetros clínicos e laboratoriais é essencial para possibilitar um diagnóstico imediato e, consequentemente, a definição de abordagens terapêuticas adequadas, personalizadas de acordo com a condição do paciente diagnosticado com infecção por dengue.

O hemograma, um exame acessível e amplamente disponíveis, desempenha papel fundamental no diagnóstico e prognóstico da dengue. A contagem de células sanguíneas, incluindo plaquetas, leucócitos e hemácias, é um componente essencial do hemograma que, frequentemente, revela alterações significativas em pacientes com dengue. Além disso, o hemograma pode fornecer informações valiosas sobre a gravidade da infecção e a presença de complicações, como a síndrome de choque da dengue (SCD).

 

1) Trombocitopenia como biomarcador diagnóstico e prognóstico de dengue (13 estudos – 62%)

A trombocitopenia demonstrou ser um parâmetro laboratorial de extrema importância, sendo observada tanto na dengue leve quanto na grave, embora as contagens mais baixas de plaquetas sejam encontradas durante os casos graves.(5) Segundo Bùi Vũ Huy et al. (2022) as plaquetas são um importante componente do sangue envolvido na coagulação. Pacientes infectados por DENV tendem a desenvolver trombocitopenia durante o curso da infecção, o que os torna vulneráveis ​​a manifestações hemorrágicas e outras complicações graves. Além disso, o DENV induz depressão da medula óssea e diminui a produção de plaquetas, podendo infectar diretamente os megacariócitos ou induzir a liberação de anticorpos que atacam e, assim, destroem as plaquetas.(5) Ademais, cabe ressaltar que a trombocitopenia na dengue está associada à imunopatogênese da dengue e ao fato de a infecção induzir o consumo de plaquetas devido à coagulação intravascular disseminada, destruição de plaquetas devido ao aumento da apoptose, lise pelo sistema complemento e envolvimento de anticorpos antiplaquetários.(6)

A contagem de plaquetas também se mostrou um biomarcador hematológico precoce, pois já se apresentava diminuída a partir das primeiras 72 horas do início da febre na dengue.(7) A OMS considerou a trombocitopenia como um dos indicadores da gravidade clínica da doença, visto ser um biomarcador sensível, pois se altera rapidamente, porém é menos específico.(6)  Dessa forma, pode-se inferir o estágio clínico dos pacientes de acordo com o grau de trombocitopenia, uma vez que as formas não graves de dengue estão associadas à contagem de plaquetas >100.000/mm³, enquanto as formas graves foram associada à contagem de plaquetas ≤100.000/mm³.(8) Além disso, contagens de plaquetas inferiores a 100 × 109/L estão associadas a internação hospitalar prolongada e maior mortalidade.(9)

 

2) Leucopenia e alterações em contagens absolutas de leucócitos no diagnóstico e prognóstico de dengue (11 estudos – 52%)

A segunda característica hematológica predominante foi a leucopenia, a diminuição de WBC ajuda a identificar pacientes com risco de desenvolver dengue grave, definida como uma contagem total de leucócitos abaixo de 4.000 células/mm³. A diminuição na contagem de leucócitos observada em pacientes com dengue deve-se sobretudo a uma diminuição na população de granulócitos. A capacidade do DENV de suprimir a produção de glóbulos brancos na medula óssea pode explicar mecanicamente o aparecimento de leucopenia em pacientes com dengue.(10)

Observamos que os casos de leucopenia decorrente da neutropenia estão associados a destruição de células progenitoras mieloides com medula óssea hipocelular nos primeiros sete dias da doença. Além disso, a interpretação adequada do leucograma pode auxiliar no prognóstico da doença, sendo que a contagem de linfócitos pode prever o tempo de internação. Quanto maiores as contagens absolutas de linfócitos, mais rápida é a recuperação da dengue e menor o tempo de internação.(11) Isto é particularmente útil em áreas remotas com instalações laboratoriais limitadas. Pacientes com linfócitos baixos e comorbidades podem ser encaminhados para um centro superior antes que desenvolvam complicações da doença.

Outro parâmetro hematológico relacionado à leucopenia e à trombocitopenia, uma vez que paciente com redução na contagem de plaquetas apresenta sete vezes mais probabilidade de apresentar uma mudança para leucopenia do que aqueles sem trombocitopenia. A maioria dos relatos que descrevem alterações hematológicas frequentes durante a infecção por dengue observou que a leucopenia é comumente observada.(9) Amogh  et al. relataram leucopenia a partir do segundo dia, atingindo o mínimo no quinto dia seguido de recuperação gradual. Nesse sentido, os linfócitos atípicos foram observados do quinto ao nono dia, atingindo o pico no sétimo dia. A monocitose foi observada do primeiro ao quarto dia e a eosinofilia ocorreu do nono ao décimo dia.(11,12)

 

3) Hemoconcentração e alterações em índices hematimétricos como preditores de formas de dengue grave (5 estudos – 24%)

Avaliamos também que, no eritrograma, a elevação da HCM, do hematócrito e da hemoconcentração ao longo da dengue estão associados ao extravasamento do plasma. Além de essas alterações nos parâmetros eritrocitários estarem associadas à resposta imune do vírus, foram observados também valores mais baixos de hemoglobina, VCM e CHCM.(13)

Um aumento na hemoconcentração e respectivamente no hematócrito é comumente observado em pacientes com infecção por dengue. O extravasamento plasmático leva a um valor elevado de hematócrito, alteração inicial associada à infecção por dengue. Um aumento no hematócrito (superior a 20%) do valor basal é um importante critério diagnóstico para dengue. A hemoconcentração tende a ocorrer em pacientes com dengue hemorrágica. Essa tendência é definida exclusivamente com base no valor inicial do hematócrito do paciente.(14)

O valor mediano de HCM foi maior em pacientes com trombocitopenia do que naqueles sem trombocitopenia; um HCM elevado foi associado a um aumento de quase duas vezes na probabilidade de desenvolver trombocitopenia entre pacientes com dengue. Atualmente, o HCM não é usado para diferenciar a infecção por dengue, e poucos estudos exploraram uma associação de um nível elevado de HCM com trombocitopenia em pacientes com dengue.(15)

Porém, em nosso estudo, descobrimos que a maioria das alterações hematológicas exibiu diferenças na sensibilidade e especificidade em relação à dengue e à malária. No entanto, o nível de HCM superior aos valores de referência foi identificado como o parâmetro mais sensível (78%) para diferenciar pacientes com dengue daqueles com malária. Nossos achados sugerem que este parâmetro pode ser útil no diagnóstico diferencial inicial da dengue e de outras infecções virais febris.(16)

Como a dengue pode agravar rapidamente, propomos que, na prática clínica diária, os pacientes sejam examinados e monitorados com frequência e que os protocolos de acompanhamento e manejo sejam melhorados para evitar a mortalidade relacionada à dengue. Nesse sentido, além do hemograma, que sejam avaliados parâmetros bioquímicos como albumina sérica, uma vez que sua redução também reflete o aumento da permeabilidade vascular, levando ao vazamento de plasma e choque na dengue.(5)

 

4) Alterações nas enzimas hepáticas como biomarcadores preditivos de dengue grave (5 estudos – 24%)

Além de biomarcadores hematológicos, também evidenciamos que a dengue pode ser monitorada pelos resultados da função hepática. Os indicadores de aspartato aminotransferase (AST) e alanina aminotransferase (ALT) indicam o prognóstico para risco de dengue grave, uma vez que lesões nas células hepáticas são relativamente comuns em pacientes com dengue e podem levar à insuficiência hepática aguda.(17)

Além disso, o estudo de Huy et al. (2022) na fase febril, na análise univariada mostrou que valores de corte de ALT/AST > 200 U/L eram prognóstico para o risco de desenvolvimento de dengue grave. Da mesma forma, os valores de corte de ALT/AST > 400 U/L eram característicos da dengue grave, em sua forma crítica, com risco elevado de mortalidade. Nesse sentido, observamos que os biomarcadores ALT e AST foram indicadores de prognóstico para dengue grave.

Em análises da função hepática também observamos que a concentração de AST no plasma é independente da concentração de ALT. Assim como, quanto mais elevadas as concentrações de ambas as transaminases maiores são os agravos clínicos dos pacientes. Podemos ressaltar que a ALT é sobretudo de origem hepática, enquanto a AST é de origem hepática e extra-hepática, tornando os resultados de AST mais específicos para danos das células hepáticas.(18)

Como os resultados demonstraram, o nível de AST foi significativamente mais elevado nos pacientes graves do que nos não graves durante a fase inicial. Observamos evidências de elevação de AST na dengue complicada, independentemente da janela de tempo. Além disso, a elevação da AST por si só foi mais indicativa de inflamação sistêmica do que de lesão hepática, embora o DENV infecte altamente os hepatócitos no contexto do tropismo da dengue.(19)

Wang et al. 2016 relataram que 52% e 54% dos casos de dengue leve e grave, respectivamente, demonstraram ALT elevada. Ao considerar o AST, essas proporções aumentaram para 75% e 80%, respectivamente. A alteração temporal das transaminases hepáticas começa no início do curso da doença e as elevações são significativamente maiores na dengue grave. Ainda assim, com poder de predição moderado, especialmente no caso de ALT.(20)

 

5) Parâmetros clínicos como preditores de dengue e dengue grave (4 estudos – 19%)

O diagnóstico inicial da dengue baseia-se apenas na história clínica, e o amplo espectro de sintomas relacionados à doença pode facilmente levar a um diagnóstico incorreto de outras doenças infecciosas de etiologia viral, como gripe, zika ou outras infecções por arbovírus.(21) A infecção da dengue caracteriza-se por apresentar variabilidade na sua apresentação clínica. O sorotipo do vírus, o estado imunitário do paciente, a concomitância com outras doenças e uma infecção adquirida anteriormente são fatores de risco para casos graves.(22)

A doença da dengue geralmente progride de 2 a 7 dias, passando por três fases – fase febril, fase crítica e fase de recuperação. As principais causas de morte são condições clínicas graves, incluindo choque, sangramento grave e falência de órgãos.(23) Na evolução dos pacientes com dengue, observamos que as manifestações de vômitos, dores abdominais e sangramentos de mucosas já na fase febril são biomarcadores clínicos de risco para dengue grave e de mortalidade. Já os achados clínicos de hepatomegalia foram observados nos pacientes que já haviam sido estadiados em fase crítica, portanto menos sensíveis que os demais sinais e sintomas.(24)

Uma pequena proporção de pacientes desenvolve uma síndrome vascular sistêmica caracterizada por sangramento, choque, encefalopatia, convulsões e comprometimento de órgãos. Isso é chamado de fase crítica e perdura de 24 a 48 horas, sendo que clinicamente a hipotensão geralmente ocorre nesta fase.(25) Já a fase de convalescença inicia-se apenas quando há resolução da hemorragia e do plasma, estabilização dos sinais vitais e reabsorção do acúmulo de líquidos. Essa fase dura de 2 a 4 dias.(26)

 

CONCLUSÃO

 

Em nosso estudo demonstramos que os parâmetros hematológicos observados precocemente durante a infecção por dengue podem predizer e estimar a gravidade e o curso da infecção por dengue. Além disso, os biomarcadores laboratoriais podem ser usados ​​para complementar testes rápidos menos sensíveis, melhorar o diagnóstico da dengue e auxiliar no manejo adequado do paciente. Dentre os biomarcadores mais promissores, os índices hematimétricos desempenham um papel crucial na triagem e no acompanhamento de pacientes com suspeita de dengue, possibilitando uma intervenção médica oportuna e adequada. Demonstramos que alterações como hemoconcentração, leucopenia e plaquetopenia podem ser utilizadas como indicadores para intervenções terapêuticas, assim como atuam como biomarcadores da gravidade da doença. Portanto, sua inclusão como parte integrante do protocolo de diagnóstico e monitoramento da dengue é de suma importância para a gestão clínica eficaz desta doença.

 

REFERÊNCIAS

 

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  2. À medida que os casos de dengue aumentam globalmente, o controle de vetores e o envolvimento da comunidade são fundamentais para evitar a disseminação da doença. Disponível em <https://www.paho.org/pt/noticias/3-8-2023-medida-que-os-casos-dengue-aumentam-globalmente-controle-vetores-e-envolvimento>. Acessado em: 01 de novembro de 2023.
  3. OMS: Brasil é o país mais afetado em novo surto de dengue nas Américas. Disponível em: <https://news.un.org/pt/story/2023/07/1817882>. Acessado em: 07 de novembro de 2023.
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Correspondência

Matias Nunes Frizzo

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