O exame citopatológico como auxiliar no diagnóstico de patologias mamárias

The cytopathological examination as an auxiliary in the diagnosis of mamary pathologies

 

Pâmela Lazzarotto1

Vera Regina Vargas de Medeiros2

Gabriela Tramontina Treviso3

Georgia M Dexheimer4

1Biomédica. Universidade do Vale do Taquari (Univates). Lajeado-RS, Brasil.
2Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI). Santo Ângelo-RS, Brasil.
3Biomédica Especialista – Feevale. Novo Hamburgo-RS.
4Doutora. Professora/ Universidade do Vale do Taquari (Univates). Lajeado-RS, Brasil.

Instituição: Universidade do Vale do Taquari (Univates). Lajeado-RS, Brasil.

Recebido em 05/08/2019

Aprovado em 11/09/2020

DOI: 10.21877/2448-3877.202100887

INTRODUÇÃO

O câncer de mama é o tumor maligno mais frequente entre as mulheres no mundo, excluindo os cânceres de pele não melanoma, sendo considerado um problema de saúde pública mundial. Para o ano de 2012, em todo o mundo, 1,67 milhão de casos novos foi diagnosticado, o que correspondeu a 25,2% de todos os tumores femininos malignos, apresentando uma taxa de incidência de 43,3 casos para cada 100 mil mulheres. No Brasil, para o biênio de 2018-2019, a estimativa foi de 59.700 casos novos de câncer de mama, com um risco estimado de 56,33 casos a cada 100 mil mulheres. A detecção precoce das patologias mamárias, além de permitir o tratamento ainda no início, pode evitar a evolução para complicações e principalmente para neoplasias.(1)

Os exames utilizados para o rastreamento do câncer de mama são o autoexame das mamas (AEM), o exame clínico das mamas (ECM) e o exame mamográfico (MMG). O AEM é realizado pela própria mulher por meio da palpação nas mamas, sendo um exame de fácil execução que deve ser realizado entre o sétimo e o décimo dia do ciclo menstrual. O ECM deve ser realizado em todas as mulheres a partir dos 40 anos, todos os anos, por profissional treinado. O MMG é realizado por meio de raios-x, sendo capaz de detectar pequenas alterações no tecido mamário e permite diagnosticar um câncer de mama em fase bem precoce, diminuindo em até 30% a mortalidade.(2)

Existem outros métodos que complementam a detec­ção precoce do câncer de mama, como a ultrasso­nografia (US), a core biopsy, a biópsia percutânea, a citologia e a mamotomia. A US permite a diferenciação entre nódulos sólidos e císticos e deve ser interpretada em conjunto com a mamografia, além de ser o exame recomendado para mulheres com idade inferior a 40 anos. Já os outros exames destinam-se à confirmação citológica e histológica das lesões detectadas pela prática clínica e pelos métodos de imagem.(2)

Biópsias muito invasivas nem sempre são a melhor opção de escolha, pois expõe o paciente a riscos, complicações e desconfortos desnecessários, sendo que grande porcentagem representa apenas lesões benignas.(3)

O exame citopatológico é uma técnica menos invasiva, gerando menos riscos e complicações ao paciente, melhor custo-benefício e resultados rápidos e precisos. O material para análise pode ser obtido através Punção Aspirativa por Agulha Fina (PAAF) de lesões palpáveis ou impalpáveis (quando guiado por US), ou pela própria secreção espontânea do derrame papilar.(4)

As categorias diagnósticas para o laudo podem ser:(5)

  • Inadequado/insuficiente: Quando o material apresenta escassez celular ou artefatos que impedem à visualização.
  • Benigno: Células normais, sem evidência suspeita de malignidade.
  • Atípico/indeterminado: Células com características benignas, mas que podem apresentar atipia nuclear e perda da coesão.
  • Suspeito de malignidade: Células com características atípicas mais marcadas que a categoria anterior, mas não suficientes para considerar malignidade.
  • Maligno: Categoria usada quando o material está claramente maligno.

Portanto, o objetivo deste estudo foi determinar se o exame citopatológico é utilizado e se realmente é uma ferramenta válida como auxiliar no diagnóstico de patologias mamárias na prática clínica de médicos ginecologistas atuantes em municípios da Serra Gaúcha (RS).

 

Material e métodos

 

Quanto ao modo de abordagem, a pesquisa classifica-se como quantitativa. Quanto ao objetivo, trata-se de um estudo descritivo que utilizou como procedimento técnico o levantamento de dados de forma transversal.

A coleta dos dados foi realizada por meio de um questionário individual e semiestruturado aplicado a 12 médicos ginecologistas atuantes em municípios da região da Serra Gaúcha. Os participantes foram convidados a participar por meio de ligação telefônica, cujos contatos foram obtidos em listas telefônicas e páginas da internet. A pesquisadora agendou uma visita onde apresentou o objetivo do estudo, procedimento e o questionário, o qual poderia ser respondido durante a visita, ou deixado aos profissionais para ser respondido posteriormente, se assim o desejassem. O questionário foi composto pelas seguintes perguntas: “Você já atendeu pacientes com algum dos sintomas citados: massa palpável; massa não palpável (achado na mamografia ou ultrassonografia) e derrame papilar? Se sim, com que frequência?. Você já realizou coleta e encaminhamento de amostra para exame citopatológico? Se sim, o exame lhe auxiliou para o diagnóstico?”

Para a análise dos resultados obtidos durante a pesquisa, a fim de comparar e analisar as informações contidas nos questionários, os dados foram tabulados na plani­lha Microsoft Excel 2010 para a geração de gráficos.

Resultados

 

Foram aplicados questionários para um total de 12 médicos ginecologistas atuantes em municípios do interior da Serra Gaúcha. A partir dos questionários respondidos, obteve-se a frequência e os tipos de lesões mais comuns encontrados na clínica médica. Pode-se observar que a lesão mais frequente foi a massa não palpável (Tabela 1).

A fim de se avaliar a quantidade de encaminhamentos, questionou-se também se os médicos já haviam enviado o material para exame citopato­ló­gico e se o mesmo os auxiliara no processo de diagnóstico das patologias da mama. Pode-se observar que todos os médicos utilizaram este exame como auxiliar no diagnóstico e que ele teve valor importante neste processo, no qual todos (100%) afirmaram já ter realizado a coleta e encaminhamento de amostra para exame cito­patológico de mama e 91,6% afirmaram que o exame os auxiliara no processo de diagnóstico.

Ainda, os médicos que responderam que já haviam realizado encaminhamento para exame citopatológico foram questionados em relação ao motivo do exame ter auxiliado ou não na conduta diagnóstica, sendo que apenas oito médicos (66,6%) relataram sua opinião (Tabela 2).

Discussão

 

Os dados coletados neste estudo mostram que as massas palpáveis e as massas não palpáveis são os sintomas mais comuns encontrados na clínica médica, deixando o derrame papilar em terceiro lugar. Um estudo semelhante, realizado na cidade de Santo Ângelo (RS), avaliou prontuários médicos de pacientes atendidas em uma clínica de mastologia e que apresentavam queixas mamárias. Neste estudo, 47,8% (n-22) das pacientes relataram nódulos palpáveis, 19,5% (n-9) relataram ser assinto­máticas (nódulos não palpáveis), 6,5% (n-3) derrame papilar e o restante relatou outros sintomas.(2) Outro estudo, realizado no Hospital do Câncer III (HCIII) do Instituto Nacional de Câncer (Inca) para tratamento e confirmação diagnóstica de lesões mamárias em 104 mulheres, apresentou resultados de nódulos mamários palpáveis para 51% das mulheres, 26% assintomáticas/nódulos não palpáveis e 6,7% com derrame papilar, ambos os resultados similares ao nosso estudo.(6) Conforme a literatura, o sintoma de derrame papilar é realmente bastante incomum, ocorrendo com prevalência de 5%-10% dos casos,(7) ao contrário do que ocorre com os nódulos, que apresentam frequên­cia de 90% dos casos.(8)

O presente estudo demonstrou que todos os médicos questionados já realizaram esta técnica em algum momento e que ela os auxiliou no diagnóstico para 91,6% deles. Para os médicos que relataram sua experiência, de uma forma geral, o exame auxilia para elucidar o diagnóstico, definir a conduta, afastar malignidade, além de ser um método simples. No Departamento Clínico de Patologia, Citologia e Medicina Forense do Hospital Universitário de Mostar, foi realizado um estudo que avaliou a acurácia da citologia de mama e seu uso para o diagnóstico, indicando a citopatologia como uma ferramenta precisa e altamente confiável para o diagnóstico de tumores, além de ser um método simples, seguro e econômico.(9) Resultados compatíveis também com o estudo realizado no Hospital Universitário Fundación Alcorón, em Madri, que comparou os resultados da citologia de mama com a histopatologia, obtendo resultados similares e concordando que a citologia possibilita diagnosticar rapidamente lesões mamárias, com resultados estatisticamente signifi­cantes e altamente seguros.(10)

Quanto à opinião relatada do médico 1, um estudo realizado na Universidade de Yokohama, no Japão, buscou registro de todas as pacientes que haviam sido submetidas à PAAF e posterior core-biopsy ou biópsia cirúrgica. O resultado deste estudo demonstrou que a PAAF obteve excelente sensibilidade, especificidade e precisão, concluindo que a citopatologia é um excelente método diagnóstico, associado à clínica e aos achados de imagem, porém, quando não coincidem, ou quando os achados forem atípicos/suspeitos ou malignos, a investigação inva­siva deve ser feita.(11) Resultados que corroboram com um estudo que revisou algumas doenças das mamas com ênfase no diagnóstico citopatológico, encontrando valores altos de sensibilidade, especificidade e precisão e sua necessidade para o diagnóstico, que deve ocorrer junto com o exame físico e mamográfico, fornecendo o tríplice diagnóstico.(12)

Em relação à opinião do médico 8, que relata que a citopatologia não define conduta no câncer de mama e que é necessário realizar anatomopatológico, um estudo realizado no Departamento de Patologia da Universidade da Flórida (EUA) traz resultados que indicam que a inutilidade da citopatologia de mama se dá quando seus resultados apresentam-se negativos ou insuficientes, mas que indicam grande suspeita no exame clínico ou de imagem, e, dessa forma, deve-se optar por realizar a análise histopatológica. Ainda, o mesmo estudo também traz que pacientes com resultados malignos confirmados, em alguns casos, não precisam ser submetidos às biopsias invasivas e que podem dar início a tratamentos neoadjuvantes.(13)

O resultado vindo do tríplice diagnóstico (exame clínico, de imagem e exame citopatológico) leva o médico a definir a melhor conduta para o paciente. Resultados benignos sugerem apenas o acompanhamento a cada seis meses, resultados malignos podem levar a exérese ou outros tratamentos, e resultados discordantes precisam de investigação mais profunda, levando a exérese/histopato­lógica.(14)

 

Conclusão

 

Com este estudo, foram obtidos resultados favoráveis para a citopatologia mamária. Todos os médicos que responderam ao questionário já realizaram coleta e encaminhamento de amostras e todos, com exceção de um, julgaram esse exame confiável, de fácil execução e boa aceitação do paciente, além de auxiliar no diagnóstico, resultados que concordam também com os outros estudos apresentados. Dessa forma, concluímos que a cito­patologia mamária é um exame que pode ser utilizado para auxiliar no diagnóstico, evitando biópsias desnecessárias e, como consequência, menor custo e desconforto para os pacientes.

 

 

Abstract

Objective: The objective of this study was to determine if the cytopathological examination is used and if it is indeed a valid tool to assist in breast disorders diagnosis in the clinical practice of gynecologists working in municipalities of Rio Grande do Sul state. Methods: Semi-structured questionnaires were applied to 12 gynecologists, who were later tabulated in the Microsoft Excel for data generation. Results: All the physicians who answered the questionnaires already sent samples for cytopathological examination of the breast and 91.6% of them reported that the examination was important in the diagnosis. Conclusion: It was obtained favorable results for mammary cytopathology, concluding that this examination may aid in the diagnosis.

 

Keywords

Cytopathological examination; breast; neoplasm

 

 

REFERÊNCIAS

  1. Brasil, Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer Jose Alencar Gomes da Silva. Coordenação de Prevenção e Vigilância. Estimativa 2018: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA, 2017.
  2. Weber Aap, Dalla-Corte E, Vargas VRA. Análise de exames citopatológico de mama e mamográficos no diagnóstico das doenças da mama, Santo Ângelo (RS), Brasil. Rev Bras Mastologia. 2012;22(4):124-130.
  3. Bruening W, Fontanarosa J, Tipton K, Treadwell JR, Launders J, Schoelles K . Systematic review: comparative effectiveness of core-needle and open surgical biopsy to diagnose breast lesions. Ann Intern Med. 2010 Feb 16;152(4):238-46. doi: 10.7326/0003-4819-152-1-201001050-00190
  4. Associação Brasileira de Laboratórios de Anatomia Patológica e Citopatologia. O que? Citopatologia? 2018.
  5. National Breast Cancer Centre. Breast Fine Needle Aspiration Cytology and Core Biopsy Aguide for Practice. 2004.
  6. Rezende R, Koch A, Figueiredo A, Thuler CS. Causas do retardo na confirmação diagnóstica de lesões mamárias em mulheres atendidas em um centro de referência do Sistema Único de Saúde no Rio de Janeiro. Rev Bras Ginecol Obstet. 2009;31(2):75-81.
  7. Chen L, Zhou WB, Zhao Y, Liu XA, Ding Q, Zha XM, Wang S. Bloody nipple discharge is a predictor of breast cancer risk: a meta-analysis. Breast Cancer Res Treat. 2012 Feb;132(1):9-14. doi: 10.1007/s10549-011-1787-5.
  8. Kösters JP, Gøtzsche PC. Regular self-examination or clinical examination for early detection of breast câncer. Cochrane Database Syst Rev 2003;2003(2):CD003373. doi:10.1002/14651858.CD0033 73,
  9. Miškovic J, Zoric A, Miškovic HR, Šoljic V. Diagnostic value of fine needle aspiration cytology for breast tumors. Acta Clin Croat. 2016;55(4):625-628. doi:10.20471/acc.2016.55.04.13
  10. Jimenez DE, Laguna ABD, Arantz SJ, Rocha AS, Goldaracena MJO, Pintos MA. Utilidad de la Punción com Aguja Fina em el diagnóstico de lesiones papilares benignas de la mama. Congresso SERAM, 2010, Madri.
  11. Ishikawa T, Hamaguchi Y, Tanabe M, Momiyama M, Crishima T, Nnakatani Y, et al. False-positive and false-negative cases of fine-needle aspiration cytology for palpable breast lesions. Breast Cancer. 2007;14(4):388-392. doi:10.2325/jbcs.14.388
  12. Baú AR, Dalla Corte EA, Vargas VRA. Exame citológico do derrame papilar, fibroadenoma, lipoma, cistos mamários, papiloma intraductal e câncer de mama. Rev. bras. anal. clin. 44(2):115-122, 2012.
  13. Rosa R, Mohammadi A, Masood S. The value of fine needle aspiration biopsy in the diagnosis and prognostic assessment of palpable breast lesions. Diag Cito. 2012;40(1)26-43. https://doi.org/10.1002/dc.21497
  14. Silva ACM, Couto HL, Leite NF, Fonseca FF, Antunes AMC, Freitas SMB, et al. Câncer de mama e patologias benignas: mastologia e equipe multidisciplinar. 154-162, 2012.

 

 

 

Correspondência

Pâmela Lazzarotto

Universidade do Vale do Taquari (Univates)

Av. Avelino Talini, 171 – Universitário

95914-014 – Lajeado-RS, Brasil