A qualidade em laboratório de análises clínicas para efetividade terapêutica: revisão de literatura

The quality in clinical laboratories for therapeutic effectiveness: literature review

 

Bianca Kirchner da Silva1, Ana Laura Remédio Zeni Beretta2

 

1  Célula de Análises Clínicas do Grupo de Saúde de Pirassununga (Academia da Força Aérea). Pirassununga, SP, Brasil.

2  Doutorado em Genética e Biologia Molecular pela Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP (2004). Campinas, SP, Brasil.

 

Recebido em 08/07/2020

Aprovado em 16/03/2022

DOI: 10.21877/2448-3877.202202036

 

INTRODUÇÃO

 

A qualidade em laboratório de Análises Clínicas é prática adotada por laboratórios de saúde que visam a obtenção de resultados de exames confiáveis e seguros. Os laboratórios utilizam técnicas e atividades operacionais para atender aos requisitos de qualidade.

Dentre os indicadores de qualidade para avaliar o desempenho do sistema analítico, são utilizados controles de qualidade, interno e externo, padronizados conforme a gestão do laboratório.

Segundo Weber:(1) “Nos laboratórios clínicos os indicadores são utilizados nas três etapas de execução de um exame: etapa ou fase pré-analítica, que corresponde ao processo anterior ao exame propriamente dito (coleta, transporte e armazenamento da amostra biológica); fase analítica, que corresponde à etapa de realização do teste; e fase pós-analítica, em que ocorre a liberação do laudo pelo profissional no laboratório e a interpretação do resultado pelo médico para que ele possa dar o diagnóstico ao paciente”.

Para o controle externo de qualidade são usados ensaios de proficiência emitidos por provedores como PNCQ e CONTROLLAB, empresas com certificado de acreditação reconhecidas pelo Sistema Nacional de Acreditação (DICQ), patrocinado pela Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (SBAC). Mediante os controles externos, são feitas comparações interlaboratoriais no intuito de assegurar que os resultados sejam verdadeiros, diminuindo os riscos e as não conformidades. Os controles internos de qualidade são usados na rotina laboratorial, que em conjunto com as amostras de pacientes avaliam se o sistema analítico apresenta resultados dentro dos intervalos preestabelecidos; na ausência de controles comerciais, métodos alternativos de controle interno apresentam alto índice de confiabilidade.

O presente estudo mostra a importância dos benefícios da implantação da qualidade em laboratórios de análises clínicas visto as constantes mudanças de técnicas e de procedimentos analíticos, inserção de novos testes no mercado e produção de equipamentos de medição de alta tecnologia. No campo profissional, observa-se a tendência à maior utilização de medicina diagnóstica no futuro. Vale ressaltar, também, as exigências de clientes por serviços e produtos de qualidade para segurança do paciente através de exames laboratoriais confiáveis, dentre outros.

 

MATERIAL E MÉTODO

 

Esse estudo será feito por meio de revisão bibliográfica em publicações e artigos científicos, nos sites SciELO, PubMed e LILACS e outras bibliotecas virtuais, além de revistas e livros com matéria ou capítulo envolvendo o assunto, utilizando as seguintes palavras-chave: qualidade em serviços de saúde, efetividade, segurança laboratorial.

 

DISCUSSÃO

 

A Resolução da Diretoria Colegiada, a RDC nº 302 de 13 de outubro de 2005,(2) estabelece como processos operacionais na fase pré-analítica que o laboratório de análises clínicas deve disponibilizar ao paciente instruções e orientações quanto à coleta de amostras, e que esse preparo deve ser de forma clara, com linguagem acessível e de compreensão do paciente. São coletados os dados cadastrais do paciente, assim como nome do médico solicitante e exames solicitados. Na fase analítica o laboratório de análises clínicas deve monitorar a qualidade do sistema analítico por meio de controle interno e externo de qualidade, sendo importante definir o grau de pureza da água reagente utilizada nas suas análises, a forma de obtenção, o controle de qualidade.

Todas as informações de procedimentos, instruções de uso de aparelhos, registros, emissão de laudos, controle de qualidade devem ser mantidos no laboratório de análises clínicas. Na fase pós-analítica, as informações com dados do laboratório, identificação e assinatura do profissional que liberou o exame, data da coleta, data da emissão de laudo devem constar no documento e a cópia de laudo deve ser arquivada pelo prazo de cinco anos.

Segundo o Dr. Arbol Correa, em entrevista à Fucks em 2019,(3) a qualidade não é obrigatória, mas a sobrevivência dessa empresa também não. Se não houver qualidade de produto e de serviço, uma empresa não irá sobreviver. O autor ainda define controle de qualidade para laboratórios clínicos, tais quais: a) promoção da satisfação do cliente; b) totalidade de características de uma entidade que lhe confere a capacidade de satisfazer as necessidades; e c) (apesar de não ser uma medida absoluta) um alvo em constante deslocamento, uma vez que as necessidades e expectativas dos clientes estão em frequentes mudanças.

Chaves⁽⁴⁾ acredita que o processo de qualidade, com sua melhoria contínua se dá, particularmente, diante das exigências dos clientes.

Desta forma, o sistema de gestão da qualidade pelo Programa Nacional de Controle de Qualidade (PNCQ), citado por Dias et al,(5) nas últimas décadas, alcançou avanços de modernização de metodologias mais exatas e abrangentes, assim como a disponibilização de equipamentos modernos e sofisticados aos profissionais analistas que exercem uma atividade sanitária importante, proporcionando-lhes atualização contínua no exercício de sua profissão e com a qualidade necessária às exigências dos clientes e da coletividade.

Constatou-se ainda que a implantação do sistema de gestão da qualidade em laboratório clínico requer o comprometimento da direção quanto às mudanças necessárias para tal iniciativa, pois são necessários esforços constantes para incorporar, em toda a equipe e níveis hierárquicos, os conceitos da busca de melhoria contínua.(5)

São consideradas responsabilidades da gestão: o planejamento da qualidade (ações para desenvolver a qualidade), o controle de qualidade (avaliação dos métodos analíticos), a garantia da qualidade (garantia que os requisitos da qualidade serão atendidos), a manutenção da qualidade (supervisão e avaliação do sistema de qualidade) e a melhoria da qualidade (resolução contínua de problemas surgidos na produção).(1)

Fortunato(6) acredita que a qualidade constitui fator estratégico de competitividade. “O aumento da competição e do nível de exigência dos clientes em termos de qualidade de produtos e serviços fomenta uma ação das empresas no sentido de dar garantias de qualidade no presente e no futuro e de maneira a que a qualidade se transforme em vantagem competitiva. A qualidade deve ser real, para acrescentar valor aos produtos e serviços e ser perceptível pelos clientes”.

As normas adotadas pelo INMETRO são: a Certificação da Organização Internacional para a Padronização (ISO) 9001 aplicável em todo tipo de organização, a ISO 17025 específica para laboratórios de ensaio e calibração e a ISO 15189 para laboratórios clínicos.⁽¹⁾

Aos laboratórios de ensaio e calibração, Fortunato(6) complementa: “A certificação das empresas se tornou rapidamente parte integral das iniciativas associadas à qualidade. Contudo, a qualidade deve ser vista como um processo contínuo de melhoria, em que a norma ISO 9000 pode representar uma base a partir da qual a organização poderá desenvolver o seu sistema, base esta necessária para outras iniciativas associadas à qualidade, como é o caso da acreditação. Só aí o laboratório clínico comprova a sua competência técnica para a realização de ensaios, com o desenvolvimento de processos capazes de proporcionar serviços fiáveis, que procuram satisfazer ou exceder as expectativas dos clientes”.

Como apoiado por Lehmann apud Fortunato,(6) o processo de acreditação dos laboratórios clínicos é uma necessidade particularmente importante para a componente laboratorial do sistema de saúde. O autor ainda cita Slagter e Loeber (2001) que dizem ser fundamental o reconhecimento de que a responsabilidade primária pela qualidade dos cuidados prestados se encontra com aqueles que oferecem os cuidados.

É de suma importância a emissão de laudos eficientes e corretos para os pacientes, com exames laboratoriais como instrumento para a monitoração de resultados da farmacoterapia, confirmação de diagnóstico, acompanhamento de tratamento pelo corpo clínico e outras classes profissionais.

Santos e Zanusso Jr.(7) afirmam que uma análise laboratorial bem realizada contribui para a preservação ou restauração da saúde do paciente, agregando elevado valor à assistência médica e otimizando a qualidade do serviço prestado.

Braga et al.(8) apud Wallach (2009) diz que a confiabilidade no resultado do exame realizado no laboratório clínico depende da execução e do monitoramento do controle e garantia da qualidade, evitando erros em todo o processo.

Segundo Plebani (2009) apud Shcolnik,(9) informações laboratoriais erradas, ocasionadas por falhas no processo laboratorial e transmitidas aos médicos, podem afetar diretamente os resultados da assistência e a segurança do paciente.

É definido, internacionalmente, que 70% dos diagnósticos médicos dependem do laboratório clínico.(3) A medicina diagnóstica demonstra sua importância, pois participa das decisões médicas, absorvendo uma pequena parte dos custos em saúde (cerca de 10%).(10)

A utilização de testes laboratoriais direcionados à prevenção de doenças será cada vez maior nos laboratórios, suportada pela medicina baseada em evidências e apoiada na pressão por redução dos custos em saúde.(9)

Fortunato(6) considera os grandes custos resultantes da perda de credibilidade nesta área da saúde e por isso os laboratórios clínicos devem optar por meios em que impere a garantia do rigor técnico, assim como um minucioso controlo no seu funcionamento, de maneira a alcançar o nível ótimo da qualidade, em que de acordo com Kelemen (2003)  apud Fortunato(6) o custo total da qualidade é mínimo.

 

CONCLUSÃO

 

Com o avanço da ciência médica e a tecnologia laboratorial na história da assistência à saúde, a rotina de um laboratório clínico aumentou diante das centenas de tipos de exames. Isso interfere, e muito, nas decisões clínicas, que são baseadas em informações contidas em exames laboratoriais.(9)

Os laboratórios clínicos que optam por meios que priorizam a garantia do rigor técnico, com a implantação de um Sistema de Gestão de Qualidade (SGQ) vão mais longe (76,2%), pois assumem melhorias no serviço prestado.(6)

Segundo Dias et al.(5) há benefícios que a implantação do SGQ gera aos laboratórios clínicos. Os benefícios são a confiança dos 95% dos clínicos em laboratórios clínicos providos de um Sistema de Gestão de Qualidade (67%). Além dos profissionais, 86% dos usuários pensam ser importante tomar essa existência como relevante na escolha de um laboratório clínico.(6)

Baseados em dados e informações selecionadas e interpretadas, conclui-se que mesmo não sendo obrigatório, a RDC 302, de 2005, estabelece aos laboratórios clínicos um processo de qualidade, com uso de controle interno e controle externo de qualidade; que na ausência desses, o uso de controles alternativos de qualidade são meios confiáveis, eficientes. Sendo que há outros indicadores de qualidade que interferem no diagnóstico e tratamento do paciente, como atraso na emissão de laudos, contaminação de uroculturas, entre outros; quando se trata de saúde, os laboratórios clínicos que buscam a acreditação e padroniza a qualidade, com melhorias contínuas, atingem em aspectos econômicos resultados positivos, gerando aos usuários do sistema de saúde e às empresas conveniadas ou públicas os benefícios para a efetividade terapêutica.

 

REFERÊNCIAS

 

  1. Weber C. Garantia da Qualidade no setor de bioquímica do Laboratório de Análises Clínicas de um Hospital Público de Porto Alegre [dissertação] [Internet] Ministério da Saúde, Grupo Hospitalar Conceição, Centro de Educação Tecnológica e Pesquisa em Saúde – Escola GHC, Fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ, Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde – ICICT, Porto Alegre, 2012. [acesso em 2019 dez 05]. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/icict/6721/1/Carolina%20Weber%5b1%5d.pdf
  2. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Diretoria Colegiada nº 302 de 13 de outubro de 2005. Dispõe sobre regulamento técnico para funcionamento de laboratórios clínicos. Brasília, DF: Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Poder Executivo; 14 out 2005, 16p.
  3. Fucks TMP. OFAC convida e Dr. Abol Correa: palestra com um visionário das Análises Clínicas, Controle de Qualidade em laboratório e os então chamados “jovens”. In: Revista NewsLab, São Paulo, Ano 26, Edição 153, 2019. p. 102-107.
  4. Chaves CD. Controle de qualidade no laboratório de análises clínicas. Transinfo [Internet]. 2010 [acesso em 2019 jul 21]; 46: 1. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1676-24442010000500002
  5. Dias VS, Barquette FRS, Bello AR. Padronização da qualidade: alinhando melhorias contínuas nos laboratórios de análises clínicas [dissertação] [Internet]. Faculdade de Ciências Médicas – Disciplina de Parasitologia – Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); 2017 [acesso em 2019 jul 23]. Disponível em: http://www.rbac.org.br/artigos/padronizacao-da-qualidade-alinhando-melhorias-continuasnos-laboratorios-de-analises-clinicas/
  6. Fortunato ARA. Gestão da Qualidade em Laboratórios Clínicos [mestrado] [Internet]. Instituto Politécnico de Viana do Castelo; 2011. [acesso em 2019 mar 09]. Disponível em: http://repositorio.ipvc.pt/bitstream/20.500.11960/1316/1/Ana_Fortunato.pdf
  7. Santos AP, Zanusso Jr G. Controle de Qualidade em Laboratórios Clínicos. Transinfo [Internet]. 2015 [acesso em 2019 jul 21]; 45:60-67. Disponível em: file:///C:/Users/User/Downloads/1230-1-3518-1-10-20180105%20(1).pdf
  8. Braga M, Marcatto LR, Santos PCJL. Importância dos exames laboratoriais na atenção farmacêutica. In: Santos PCJL. Farmácia clínica & atenção farmacêutica: contexto atual, exames laboratoriais e acompanhamento farmacoterapêutico, Rio de Janeiro, Atheneu, 2018. p. 99-108.
  9. Shcolnik W. Erros laboratoriais e segurança do paciente: revisão sistemática [Dissertação Mestrado]. Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Rio de Janeiro, 2012.
  10. Campana GA, Oplustil CP, Faro LB. Tendências em medicina laboratorial. Transinfo [Internet]. 2011 [acesso em 2019 jul 30]; 47: 1. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1676-24442011000400003

Correspondência

Bianca Kirchner da Silva

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