Fatores de risco e principais alterações citopatológicas do câncer bucal: uma revisão de literatura

Risk factors and major cytopathologycal changes of oral cancer: a review of literature

 

Rivelilson Mendes de Freitas¹

Aldenora Maria Ximenes Rodrigues²

Anselmo Ferreira de Matos Júnior³                            

Guilherme Antônio Lopes de Oliveira4

 

 

¹Doutor em Farmacologia – Universidade Federal do Ceará – UFC(Adjunto) – Fortaleza, CE, Brasil.

²Mestranda em Ciências Farmacêuticas – Laboratório de Pesquisa em Neuroquímica Experimental da Universidade Federal do Piauí – UFPI – Picos, PI, Brasil.

³Discente do Curso de Pós-graduação em Citologia Clínica da Faculdade Ateneu – Fortaleza, CE, Brasil.

4Doutorando em Biotecnologia – Renorbio – Universidade Federal do Piauí – UFPI – Picos, PI, Brasil.

 

Instituição: Universidade Federal do Piauí – UFPI – Picos, PI, Brasil.

 

Artigo recebido em 10/01/2013

Artigo aprovado em 29/01/2016

 

 

Resumo

A incidência de câncer tem aumentado significativamente em todo mundo, sendo um dos mais importantes problemas de saúde pública. O objetivo deste estudo foi realizar uma revisão bibliográfica sobre os fatores de risco, efeitos do tabagismo e etilismo na mucosa bucal e principais alterações citopatológicas observadas no câncer bucal. Realizou-se uma revisão sistemática através da base de dados MEDLINE e LILACS no ano de 2012, usando-se as palavras-chave: Oral cancer, oral Cytopathology, Alcoholism, Smoking. Foram selecionados artigos publicados entre 1986 a 2006. O câncer bucal tem aumentado de forma significativa, estando entre os dez cânceres mais frequentes, apresentando a maior taxa de mortalidade no segmento cabeça e pescoço, mas apresenta também um grande índice de sobrevida em relação a outros tipos da doença, se detectado preco­cemente. Os fatores que estão ligados ao surgimento e desenvolvimento dessa patologia são inúmeros e, em relação à neoplasia bucal, diversos são os carcinógenos que desencadeiam uma cascata de eventos resultando neste tipo de câncer. A literatura estudada evidencia a estreita correlação entre os casos de câncer bucal e fatores considerados de risco, como o tabagismo e o alcoolismo, usados isoladamente, e, ainda, mais acentuados, se ambos os fatores estiverem associados entre si.

 

Palavras-chave

Neoplasias bucais; Alcoolismo; Tabagismo; Patologia bucal

 

 

INTRODUÇÃO

 

O número de casos de câncer tem aumentado de maneira significativa em todo o mundo, principalmente a partir do século passado, configurando-se atualmente em um dos mais importantes problemas de saúde pública mundial.(1) Consequentemente, a incidência de câncer de boca também tem aumentado de forma significativa, sendo o sexto tumor mais comum em todo o mundo. Nos EUA, cerca de 40 mil casos são diagnosticados a cada ano.(2)

De todos os tumores malignos que afetam a região oral, 94% destes correspondem ao carcinoma de células escamosas oral (CCEO).(3) O CCEO é uma neoplasia epitelial maligna agressiva, que acomete principalmente o sexo masculino na faixa etária dos 50 aos 80 anos. Entretanto, a incidência de casos entre as mulheres encontra-se semelhante à dos homens, provavelmente devido ao aumento da exposição a agentes carcino­gênicos.(4)

De etiologia desconhecida, vários fatores parecem estar envolvidos nessa patologia, tanto extrínsecos quanto intrínsecos, sendo que os fatores extrínsecos incluem: o fumo de tabaco, tabaco sem fumaça, masca de bétel, álcool, exposição aos fenóis, infecções por Candida sp. e por vírus oncogênicos, bem como sífilis.(5) Como fatores intrínsecos enquadram-se os estados sistê­micos ou generalizados como desnutrição, anemia por deficiência de ferro, deficiência de vitamina A e susce­tibilidade genética.(3)

Há unanimidade na literatura científica em relação à língua ser a localização preferencial para o desen­volvimento de CCEO, seguida pelo assoalho da boca.(6) No entanto, não há consenso em relação à frequência dos outros sítios anatômicos. A citopatologia é um méto­do que se fundamenta na possibilidade de analisar as células coletadas das lesões e interpretar, à microscopia de campo claro, o esfregaço corado obtido a partir do material coletado. Em lesões orais, as células são obtidas pela raspagem na superfície da lesão suspeita, possi­bilitando a análise das características citopatológicas e a classificação da lesão. Essa técnica é bem aceita pelos pacientes, aspecto esse que pode ser bastante útil para o diagnóstico.(7)

Entre as muitas vantagens, a citopatologia se destaca por ser rápida, de custo baixo, não invasiva, uma vez que o material é facilmente coletado por não necessitar de anestesia infiltrativa, sendo o incômodo eliminado com a utilização de anestésico tópico; o método também apresenta alta especificidade e sensi­bilidade, o que viabiliza a sua utilização como exame de rotina; minimiza a possibilidade de infecção e hemorragia em pacientes imunossuprimidos, permitindo a aplicação de novas téc­nicas quantitativas, citomorfológicas, de imunocitoquí­mica e de biologia molecular, proporcionando maior precisão no diagnóstico. Outro aspecto interes­sante é a identi­fica­ção de células anormais, utilizando-se programas espe­cializados de computador que podem agilizar a análise dos esfregaços, o diagnóstico do patologista e o trata­mento.(8)

Portanto, partindo desses pressupostos, o objetivo deste estudo foi realizar uma revisão bibliográfica sobre os fatores de risco, os efeitos do tabagismo e do etilismo na mucosa bucal e as principais alterações citopato­lógicas observadas no câncer bucal.

 

MATERIAL E MÉTODOS

 

Neste contexto fez-se uma revisão bibliográfica sistemática sobre as principais alterações citopato­ló­gicas da mucosa bucal exposta a carcinógenos. Des­creveram-se a epidemiologia do câncer bucal, seus fato­res de risco e os efeitos do etilismo, do tabagismo e da associação no desenvolvimento deste, bem como os resultados da citopatologia desta neoplasia. Realizou-se uma revisão sistemática por meio do MEDLINE e LILACS no ano de 2012, usando-se as seguintes palavras-chave: Oral cancer, oral Cytopathology, Alcoholism, Smoking. Foram sele­cionados artigos publicados entre os anos de 1986 a 2006. Todos os artigos encontrados, preferencialmente artigos de revisão, revisões sistemá­ticas e ensaios clínicos foram utilizados.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

Câncer bucal

 

O câncer é responsável por mais de 12% de todas as causas de óbito no mundo, mais de 7 milhões de pessoas morrem anualmente dessa patologia. Com o aumento da expectativa de vida, a incidência de câncer, que em 2002 foi de 11 milhões de casos, alcançará, segundo a International Union Against Cancer (UICC), mais de 15 milhões em 2020.

A explicação para esse crescimento está na maior exposição dos indivíduos a fatores cancerígenos. A rede­finição dos padrões de vida, a partir da uniformização das condições de trabalho, nutrição e consumo, desen­cadeada pelo processo global de industrialização, tem reflexos importantes no perfil epidemiológico das popu­lações. As alterações demográficas, com redução das taxas de mortalidade e natalidade, indicam o pro­longamento da expectativa de vida e o envelhecimento populacional, levando ao aumento da incidência de doenças crônico-degenerativas, especialmente as pato­logias cardiovasculares e as neoplasias.

As neoplasias constituem, assim, um problema de saúde pública para os países desenvolvidos e em desen­volvimento. A carcinogênese é um processo que envolve as etapas de iniciação, promoção e progressão tumoral. A iniciação tumoral está relacionada com danos ao DNA, resultante de mutações causadas por carcinógenos. As células iniciadas podem sofrer ação de agentes pro­motores, que estimulam sua proliferação, podendo induzir o desenvolvimento do câncer. O processo que desen­cadeia o desenvolvimento das neoplasias é consequência de um acúmulo de mutações nos genes que regulam o crescimento, a diferenciação e a morte celular.(9)

O Brasil é o terceiro país no mundo com maior índi­ce de câncer de boca. Este tipo de câncer é uma doença pouco conhecida em relação aos outros tipos de neo­plasias, tendo geralmente seu diagnóstico tardio.(10) Estudos realizados em diferentes países concordam no que diz respeito à epidemiologia do câncer de boca. A doença é mais comum em homens na faixa etária acima dos 40 anos. Os sítios anatômicos de maior prevalência são o lábio inferior, a borda da língua e o assoalho bucal. Con­tudo, evidências recentes mostram um aumento do nú­mero de casos em indivíduos mais jovens na faixa etária abaixo dos 40 anos.(11)

Segundo a literatura, 90% a 95% dos casos de câncer bucal correspondem ao carcinoma epidermoide ou car­cinoma espinocelular, sendo as lesões classi­ficadas em ulceradas, nodulares ou vegetantes. Pode se apresentar em formato de úlcera que não cicatriza, assintomático, podendo ser observado no lábio, língua, glândulas salivares, gengiva, assoalho de boca, mucosa da bochecha, vestíbulo da boca, palato e úvula. No estágio inicial, pode se apre­sentar como manchas esbranquiçadas ou avermelhadas e ulcerações super­ficiais assintomáticas. Em seu estágio avançado, as úlceras se apresentam maiores, dolorosas, com odor fétido. A neoplasia pode infiltrar nas estruturas subja­centes e os pacientes geral-mente apresentam emagre­cimento acentuado, dificuldade para falar, mastigar e deglutir.(12)

 

Fatores de risco do câncer bucal

A mucosa bucal é bastante vulnerável a uma série de lesões induzidas por agentes físicos, químicos e biológicos. Outros fatores de risco para o aparecimento do câncer bucal podem ser herdados ou adquiridos, dentre eles podem ser citados a radiação solar, vírus, fungos, ausência de higiene bucal, má alimentação, taba­gismo, etilismo, dieta rica em gorduras, ferro e/ou pobre em proteínas e vitaminas (A, E, C, e B2).(11)

Vários trabalhos relatam que o câncer bucal é mais prevalente em homens, apesar deste quadro estar sendo alterado pelo aumento do número de mulheres tabagistas e etilistas. Sessenta por cento dos pacientes com câncer bucal apresentam os estágios III e IV da doença, corres­pondendo ao tratamento não curativo.(10)

Embora a etiologia do câncer bucal esteja relacionada a múltiplos fatores, estudos revelam que o álcool e o fumo são fatores etiológicos potenciais para o surgimento do câncer de boca mesmo em indivíduos com idade inferior a 45 anos.(11,13)

 

Tabagismo e o câncer bucal

Como fatores ambientais predisponentes ao câncer bucal, segundo os trabalhos pesquisados, o tabagismo constitui o fator primordial (90%), sendo que os tabagistas apresentam uma probabilidade de 4 a 15 vezes maior de desenvolver a doença do que os indivíduos não taba­gistas.(14)

O tabaco é extremamente agressivo, como também as substâncias cancerígenas que o compõem, aliadas à alta temperatura alcançada pelo cigarro aceso. Embora o tabaco sem fumaça (rapé e tabaco para mascar) também possa favorecer o aparecimento da doença, uma vez que os resíduos deixados entre bochecha e língua apresentam um contato mais prolongado, favorecendo desta maneira a ação das substâncias cancerígenas do tabaco sobre a mucosa bucal. No entanto, o uso de cachimbos e charutos também é considerado um importante fator de risco para o câncer bucal e de faringe.

O ato de fumar ou mascar tabaco pode causar rea­ções oxidativas nos tecidos, que implicam na iniciação de reações que produzem radicais livres nos eventos celulares. Assim, a presença de oxigênio reativo pode causar dano às proteínas, carboidratos, lipídios e DNA. O menor dano ao DNA pode resultar em mutagênese e em alteração do ciclo celular. Vários produtos da combustão do ato de fumar tabaco são carcinogênicos, dentre os quais os hidrocarbonetos aromáticos polinucleares são predominantes. Um aumento da permeabilidade da mucosa bucal facilita a passagem da N-nitrosonorcicotina, uma das nitrosaminas carcinogênicas do cigarro.(14)

Os pacientes não fumantes também podem ser acometidos por fatores etiológicos do câncer bucal, embora seja evidente que o uso do tabaco é um grande fator de risco para o aparecimento da doença e para as lesões potencialmente malignas. O tabagismo é fator de risco independente para o desenvolvimento do câncer bucal, aumentando o risco relativo em sete a dez vezes em comparação com os não fumantes.(14) O aumento do risco de aparecimento do câncer bucal, associado ao tabagismo, tem uma relação que varia tanto com a intensidade do consumo de cigarros por dia como pela dura­ção em longo prazo do hábito de fumar. No entanto, também é sabido que o tabagismo associado ou não ao etilismo aumenta de forma significativa o aparecimento da doença.(15)

O Instituto Nacional do Câncer(10) aponta o fumo como o principal agente causador de morte por câncer no país, sendo que o risco de óbitos por câncer de boca em fumantes é considerado trinta vezes maior que em não fumantes. A ação do fumo na mucosa bucal tem sido avaliada,(16-18) e sua relação com as alterações celulares induzidas durante a carcinogênese é resultante da queima do tabaco, que é considerado um agente iniciador.

São identificadas no tabaco e na fumaça aproxima­damente 4.700 substâncias tóxicas; entre elas, sessenta apresentam ações carcinogênicas, destacando-se os hidrocarbonetos policíclicos e as nitrosaminas específicas do tabaco.

 

Etilismo e o câncer bucal

Estudos apontam o etilismo como o segundo fator ambiental causador do câncer bucal (principalmente nos casos de câncer de língua e assoalho de boca), ainda que não esteja associado ao tabagismo. Reis et al.(19) demonstram que substâncias tóxicas produzidas pelo etanol interagem com o DNA, provocando erros durante a multiplicação das células, o que pode acarretar no apare­cimento do câncer. Quando a divisão celular é rápida e desordenada, devido à ação destas substâncias, o núcleo celular pode perder algumas porções de DNA, expondo as células a estas substâncias que alteram o padrão de multiplicação celular e produzem lesões que podem levar ao desenvolvimento do câncer.

O consumo de álcool também eleva a atividade metabólica do fígado, tanto em humanos como em animais usados em experiências, podendo ativar substâncias carcinogênicas. Pode ainda alterar o meta­bolismo intra­celular das células epiteliais com as quais entra em contato (efeito local). Este prejuízo da função celular pode ser agravado se existirem deficiências nutri­cionais. A concentração de etanol obtida em humanos pode causar irritação local, de acordo com a variedade de bebidas alcoólicas e a quantidade de etanol nelas contida, a proporção ingerida, bem como a frequência do hábito.(14)

O etanol não tem ação carcinogênica e não causa dano direto ao DNA, entretanto, o seu primeiro produto metabólico, originado a partir da ação da enzima álcool desidrogenase (ADH), o acetaldeído, tem ação muta­gênica. O acetaldeído é capaz de induzir alterações celu­lares, como a quebra da fita de DNA, sendo consi­derado um agente genotóxico.(20)

O etanol pode ter um efeito direto sobre a mucosa, alterando a homeostase das células epiteliais, alterando a estrutura da mucosa ou induzindo um aumento da per­meabilidade do epitélio. Dessa forma, o etanol atua como agente facilitador para a penetração de carcinógenos, tornando os tecidos mais suscetíveis à sua ação.(20)

 

Associação etilismo/tabagismo e o câncer bucal

O álcool e o tabaco foram apontados como os dois maiores fatores específicos para o surgimento de carci­noma epidermoide de cavidade bucal, apesar de outros fatores secundários também terem sido elencados no risco de incidência deste tipo de câncer. O álcool, assim como o fumo, também é um fator etiológico potencial para o desenvolvimento do câncer de boca.(19)

A associação entre o fumo e o álcool na etiologia do câncer de boca está relacionada com esse efeito de aumento da permeabilidade causado pelo álcool, que pode ocasionar um aumento da penetração dos carcinógenos presentes no tabaco.(21)

Devido à dificuldade em se obterem informações acuradas referentes ao hábito de ingestão de álcool, são poucos os estudos em humanos que avaliam o efeito do mesmo isoladamente nas células da mucosa bucal. Além disso, há dificuldade de se isolarem os efeitos do álcool e do tabaco, uma vez que a maioria dos tabagistas faz uso de bebidas alcoólicas.(22)

Os efeitos do álcool e do fumo sobre a mucosa bucal foram estudados por meio das células epiteliais da mesma, obtidas por raspagem e analisadas a partir da cito­pa­tologia, que consiste de um método de exame funda­mentado na análise microscópica de células epite­liais.(17)

 

Citopatologia do câncer bucal

A citopatologia, em seu início, foi utilizada no diag­nóstico de lesões uterinas. Após algumas adaptações, a citopatologia pode ser aplicada ao estudo das células esfoliadas da cavidade bucal.

O epitélio bucal mantém sua homeostase pelo processo de renovação celular contínuo. As alterações nesse processo de maturação epitelial podem ser observadas através da citopatologia. Muitos estudos foram realizados para se avaliar o padrão de maturação celular de diferentes regiões da boca, chegando à conclusão que os seus sítios anatômicos apresentam diferentes graus de maturação epitelial. A citopatologia também foi utilizada para avaliação das alterações no padrão de maturação epitelial causados por diferentes estímulos, destacando-se, entre eles, o fumo.(16,23,24)

Para a coleta em citopatologia bucal, os instrumentos devem ser de fácil utilização, não devem causar des­con­forto e deve-se coletar um número significativo de células epiteliais.(17) Cançado et al.(17) sugerem que a citologia em meio líquido resulte em menor quantidade de muco e restos alimentares nos esfregaços citológicos da cavidade bucal, facilitando o diagnóstico citopato-lógico.(25,26) A técnica consiste em transferir o material coletado para um meio líquido, que tem propriedade de preservar as estruturas morfológicas e moleculares do esfregaço. No entanto, a sua aplicação, bem como a sua validação na mucosa bucal, ainda não foram estabelecidas.

A citopatologia tem sido utilizada com o intuito de identificar alterações celulares prévias ao aparecimento de lesões clinicamente detectáveis,(16,27) para controle periódico de pacientes em exposição crônica aos carci­nógenos do fumo e do álcool e como meio de rastre­amento de alterações celulares em população de alto risco para o desenvolvimento deste tipo de câncer.(17,24)

 

Principais alterações citopatológicas do câncer bucal

Mckee(28) descreveu as principais alterações celulares como degenerativas, inflamatórias, reparadoras e neo­plásicas. Nas alterações celulares degenerativas ocorre um aumento no tamanho da célula, o limite nuclear fica nitidamente enrugado e o núcleo torna-se picnótico. Tam­bém pode haver a presença de cariorrexe (desintegração do núcleo) e cariólise (dissolução do núcleo). Já nas alte­rações inflamatórias há um aumento do núcleo (hipertrofia nuclear), marginalização da cromatina, bi ou multinucle­ação, presença de halo perinuclear e vascularização do citoplasma (vacúolos isolados e vacuolização em colmeia). Quando as células apresentam núcleo hipertrófico, multinucleação com nucléolos proeminentes e células em folhetos e tecido encontram-se em processo de reparo. As células neoplásicas apresentam irregularidade, hiper­cromasia e com hipertrofia nuclear conforme demonstrado na Tabela 1.

 

artigo-2-tabela

 

Birman e Sugaya(29) citaram as alterações celulares mais importantes observadas a partir da citopatologia do câncer bucal, dentre elas: anisocitose, vacuolização, propriedade alterada dos corantes, inclusão citoplasmática e polimorfismo. Dentre as alterações nucleares desta­caram: hipercromatismo, hipo ou policromia, irregularidades da membrana, multinucleação, figuras mitóticas aberran­tes e alterações degenerativas. Células esfoliadas de lesões ocasionadas por irritação crônica mostram um predomínio de células ceratinizadas; em contrapartida, em áreas de ulceração profunda há maior número de células imaturas.

As células de lesões malignas intrabucais apre­sentam as seguintes características: aumento nuclear, variação no tamanho e forma do núcleo, aumento na razão núcleo/citoplasma, nucléolos múltiplos e predominantes, hipercromatismo, anormalidade na cromatina e distri­buição discrepante na maturação das células.

Ogden et al.(22) demonstraram que a citopatologia é escassa em amostra de células da camada basal quando o epitélio bucal está intacto. Isto indica que a técnica de citologia não remove células das camadas mais profundas do epitélio, como as células de lâmina basal. Porém, a carência de células basais em esfregaços não neces­sariamente reflete pobreza da técnica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Existem vários fatores de risco (tabagismo, etilismo, dieta, predisposição genética, fatores traumáticos e envol­vimento viral) associados ao câncer bucal; entretanto, o tabaco e álcool etílico são os principais fatores de risco envolvidos. Devido ao alto número de tabagistas e etilistas na população brasileira, o câncer bucal é um problema de saúde pública.

A maioria dos indivíduos com câncer bucal só pro­cura tratamento em estágios avançados, o que com­pro­mete a cura desta patologia. Assim, é de suma impor­tância que um programa de prevenção eficiente e de baixo custo seja implantado no Sistema Único de Saúde, uma vez que aumenta a possibilidade de cura desses paci­entes.

A possibilidade de se utilizar a citopatologia para avaliar os efeitos do etilismo e tabagismo em pacientes com a mucosa oral normal torna a prevenção e o trata­mento desta neoplasia mais eficiente. Essa técnica me­lhora também a análise das amostras e a interpretação dos resultados, sendo um importante fator para a redução da incidência do câncer bucal.

 

 

 

Abstract

The incidence of cancer has increased significantly throughout the world, is today one of the most important public health problems. The objective of this study was to review the literature on risk factors, the effects of tobacco and alcohol in the oral mucosa and the major changes observed in the oral cancer. We performed a systematic review using the MEDLINE and LILACS in the year 2012 using the following key words: Oral cancer, oral Cytopathology, Alcoholism, Smoking. Articles published from 1986 to 2006. The oral cancer has increased significantly, being among the ten most common cancers and has the highest mortality rate in head and neck but also has a high rate of survival when compared to other types of disease, if detected early. The factors that are linked to the emergence and development of this disease are numerous and, in relation to oral cancer, several are the carcinogens that trigger a cascade of events that results in this type of cancer. The literature study shows the close correlation between cases of oral cancer and the risk factors such as smoking and alcohol, used alone, and even more pronounced if both factors are associated with each other.

 

Keywords

Mouth neoplasms; Pathology, Oral; Alcoholism; Smoking

 

 

Referências

  1. World Heath Organization (WHO). Policies and managerial guidelines for national cancer control programs. Rev Panam Salud Publ. 2002;12(5):366-70.
  2. Lingen MW, Kumar V. Cabeça e Pescoço. In: Kumar V, Abbas A, Fausto N. Patologia: bases patológicas das doenças. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. p. 820.
  3. Neville BW. Patología Epitelial. In: ______. Patologia oral & maxilofacial. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2004. p. 325-54.
  4. Neville BW, Day TA. Oral cancer and precancerous lesions. CA J Clinic. 2002;52(4):195-215.
  5. Silverman S, Eversole LR. Lesões pré-malignas e carcinoma de células escamosas bucais. In: Silverman S, Eversole LR, Truelove EL. Fundamentos de medicina oral. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. p. 185-204.
  6. Carvalho MB, Lenzi J, Lehn CN, Fava AS, Amar A, Kanda JL, et al. Clinical and epidemiological characteristics of oral squamous cell carcinoma in women. Rev Assoc Med Bras. 2001 Jul;47(3):208-14.
  7. Mehrotra R, Gupta A, Singh M, Ibrahim R. Application of cytology and molecular biology in diagnosing premalignant or malignant oral lesions. Mol Cancer. 2006 Mar;5:11.
  8. Diniz-Freitas M, García-García A, Crespo-Abelleira A, Martins-Carneiro JL, Gándara-Rey JM.. Applications of exfoliative cytology in the diagnosis of oral cancer. Med Oral. 2004 Aug-Oct;9(4):355-61. [Article in English, Spanish].
  9. Junqueira LC, Carneiro JÁ. Célula Cancerosa. In: ______. Biologia celular e molecular. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001. p. 292-301.
  10. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional do Câncer. Falando sobre câncer da boca. [Informativo na internet]. 2003 [acesso em 22 dez 2009]. Disponível em://http:www.inca.gov.br/.
  11. Zavras AI, Douglas CW, Joshipura K, Wu T, Laskaris G, Petridou E, et al. Smoking and alcohol in the etiology of oral cancer: gender-specific risk profiles in the south of Greece. Oral Oncol. 2001 Jan;37(1):28-35.
  12. Amorim AG, Amorim RFB, Freitas RAA. Estudo epidemiológico do carcinoma epidermoide oral: análise de 85 casos. Odontol Clín Cient. 2012;1(1):41-5.
  13. Polednak AP. Recent trends in incidence rates for selected alcohol- related cancers in the United States. Alcohol Alcohol. 2005 May;40(3):234-8.
  14. Leite ACE, Guerra ENS, Melo NS. Fatores de risco relacionados com o desenvolvimento do câncer bucal. Rev Clín Pesq Odontol. 2005;1(3):31-6.
  15. Danesi CC, Marconato CM, Spara L. Câncer de boca: um estudo no hospital universitário de Santa Maria. Rev Bras Cancerol. 2002;46(20):179-82.
  16. Pinto TAS, Rados PV, Santana Filho M, Barbachan JJD. Avaliação quantitativa de núcleo/citoplasma e AgNORs em células da mucosa bucal de fumantes e não-fumantes. Rev Fac Odontol. 2003 Dez;44(2):17-21.
  17. Cançado RP, Yurgel LS, Filho MS. Evaluation of the nucleolar organizer region associated proteins in exfoliative cytology of normal buccal mucosa. Effect of smoking. Oral Oncol. 2001 Jul;37(5):446-54.
  18. Bohrer PL, Filho MS, Paiva RL, da Silva IL, Rados PV. Assessment of micronucleus frequency in normal oral mucosa of patients exposed to carcinogens. Acta Cytol. 2005 May;49(3):265-72.
  19. Reis SRAA, Lima CR, Marchionni AMT, Setúbal MG. Fatores de risco do câncer da cavidade oral e da orofaringe. I. fumo, álcool e outros determinantes. RPG Rev Pós-grad. 1997 Abr;4(2):127-32.
  20. Howie NM, Trigkas TK, Cruchley AT, Wertz PW, Squier CA, Williams DM. Short-term exposure to alcohol increases the permeability of human oral mucosa. Oral Dis. 2001 Nov;7(6):349-54.
  21. Du X, Squier CA, Kremer MJ, Wertz PW. Penetration of N-nitrosonomicotine (NNN) across oral mucosa in the presence of ethanol and nicotine. Oral Pathol Med. 2000 Feb;29(2):80-5.
  22. Ogden GR, Cowpe JG, Wight AJ. Quantitative oral exfoliative cytology; review of methods of assessment. J. Oral Pathol Med. 1997 May;26(5):201-5.
  23. Paiva RL, Santana Filho M, Bohrer PL, Lauxen IS, Rados PV. AgNOR Quantification in Cells of Normal Oral Mucosa Exposed to Smoking and Alcohol A Cytopathologic Study. Anal Quant Cythol Hystol. 2004 Jun;26(3):175-80.
  24. Bohrer PL. Avaliação das alterações citopatológicas da mucosa clinicamente normal exposta a carcinógenos. Rio Grande do Sul. Dissertação [Mestrado em Patologia Bucal] – Faculdade de Odontologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2005.
  25. Castle PG, Solomon D, Hildesheim A, Herrero R, Concepcion Bratti M, Sherman ME, et al. Stability of archived liquid: based cervical cytologia specimens. Cancer. 2003 Apr;99(2):89-96.
  26. Klinkhamer PJ, Meerding WJ, Rosier PF, Hanselaar AG. Liquid-based cervical cytology. Cancer. 2003 Oct;99(5):263-71.
  27. Gedoz L, Pinto TAS, Ana Filho MS, Rados PV. Citopatologia esfoliativa da mucosa bucal: controle de pacientes com leucoplasias. In: Congresso Internacional de Odontologia de São Paulo. 2002, São Paulo.
  28. Mckeer GT. Citopatologia. 1ª. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
  29. Birman EG, Sugaya NN. Citologia no diagnóstico do câncer bucal. In: Kowalski L A, Dib LL, Ikeda MK, Edd C. Prevenção, diagnóstico e tratamento do câncer bucal. São Paulo: Frontis Editorial, 1999.

 

 

 

Correspondência

Aldenora Maria Ximenes Rodrigues

Universidade Federal do Piauí – UFPI

Rua Cícero Eduardo, s/n, Junco

64600-000 – Picos, PI, Brasil